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segunda-feira, 21 de setembro de 2015

Refugiados sem terra prometida
O atual drama dos refugiados constitui um fenómeno e desacerto humanitário pior que o movimento dos povos revelado pela história da antiguidade oriental e das grandes guerras dos séculos posteriores.
Quando, cerca do ano 1900 antes de Cristo, Abraão deixou a Caldeia e emigrou com seu povo e rebanhos para a Palestina e, depois, para o Egipto, fixou-se nos melhores terrenos agrícolas, tendo-os desenvolvido, chegando a enriquecer e aumentar a população do povo Hebreu. Com inveja da prosperidade dos Hebreus, os Egípcios iniciaram uma violenta perseguição contra aqueles. Apostando na aniquilação dos Hebreus, o faraó egípcio ordenou que fossem lançados ao rio Nilo todos os recém-nascidos varões, filhos de Hebreus. Mas quando o menino Moisés foi salvo do Nilo e se tornou o chefe dos Hebreus, estes quiseram sair do Egipto para regressar à sua terra prometida – a Palestina - mas foram impedidos  pelo rei, porque, embora odiados, faziam falta no trabalho. O êxodo dos Hebreus apenas foi permitido quando o Egipto foi assolado com muitas calamidades, chegando à Palestina 40 anos depois, mas sem o chefe Moisés, por ter falecido.

Quando, em 1940, estavam eminentes ataques da Alemanha, liderada pelo nazi Hitler, a  Gibraltar que foi transforma numa base militar, cerca de 14 mil gibraltinos foram obrigados a abandonar tudo o que tinham e refugiarem-se noutros países até terminar a II Guerra Mundial. Daqueles refugiados, a Madeira prontificou-se a acolher cerca de 2500, tendo chegado ao Funchal entre 21 de julho e 13 de agosto daquela ano, na sua maioria mulheres e crianças. Ficaram instalados em casas particulares, pensões e hotéis, integrando-se perfeitamente na sociedade madeirense.

Por causa de guerras de natureza diferente, mas causadoras de insegurança e fome, o século XXI está a ser fértil em refugiados que estão localizados em alguns países do norte de África e no Médio Oriente. Dos cerca de 20 milhões de habitantes da Síria, cerca de 12 milhões estão deslocados. Mas já desde 1991 funciona o Centro Português de Refugiados e, em 2005, vieram para Portugal alguns refugiados da Palestina. E, desde 2006, o Centro de Acolhimento, na Bobadela, já acolheu centenas de refugiados.
Agora, nem há “terra prometida” porque os migrantes/refugiados da nova vaga desesperam por encontrar refúgio em países, cujos governos a muito custo os aceitam. Querem entrar em países da União Europeia, onde os fracos e hipócritas dirigentes são incapazes de tomar medidas rápidas de acolhimento de milhares de deslocados que fogem da morte, acabando por encontrar entraves de toda a ordem com ausência de proteção. E muitos morrem sem atingir o desejado destino. Não há rio Nilo mas há Mar Mediterrâneo que serve de sepultura a muitos dos cerca de 500 mil deslocados!

Muitos «muros da vergonha» foram e são construídos para travarem o avanço seguro dos migrantes e refugiados. Nem convenções internacionais, nem Tratado de Chengen dão adequada proteção internacional a quem não tem outra forma de sobreviver senão deixar tudo o que tem e partir para lugar incerto. Nem são emigrantes nem terroristas.  É a sobrevivência que está em causa.
A Hungria, país membro da União Europeia, construiu muros de arame farpado para estancar a entrada de refugiados, sem oposição dos dirigentes das instituições europeias. Mas outros muros, noutros países e regiões do globo foram construídos com fins semelhantes. A Muralha da China, estrutura de arquitetura militar, tinha a função de defesa. O Muro de Berlim servia para impedir a passagem de pessoas da Alemanha de Leste para ocidente. O muro na fronteira dos Estados Unidos da América com o México, iniciado em 1994, serve para impedir a entrada de imigrantes ilegais nos Estados Unidos.
Da história dos imigrantes ilegais/refugiados ressalta, atualmente, duas questões importantes a ter em conta: a primeira é haver capacidade dos governos para estancar a saída de população, modificando e acabando com fatores militares, económicos e sociais que estão na origem dos movimentos dos povos para lugares não garantidos; a segunda é aceitar nos países de destino os que não podem regressar ao país de origem, tratando-os como pessoas de direito, mas cuidando da sua segurança e enquadramento no meio, sem demagogia e sem laxismo. A Madeira pode e deve dar o exemplo dos Gibraltinos!




quarta-feira, 16 de setembro de 2015

Emigrantes que não votam
Apesar do nº 2 do artigo 44º da Constituição da República (CRP) garantir aos cidadãos o direito de emigrarem, já quando se trata de atribuir o direito de voto a mesma CRP e as respetivas leis eleitorais contemplam graves contradições e limitações, conforme se trata de eleições europeias, nacionais, regionais e locais.
O recenseamento e o voto dos emigrantes nos consulados ou em postos suplementares no estrangeiro não incentiva o dever cívico de votar. Outra das contradições é o facto de se verificar que o número de recenseados no estrangeiro nada tem a ver com o total de emigrantes e seus descendentes com nacionalidade portuguesa. É que o recenseamento é obrigatório para os residentes no território continental e nas regiões autónomas, mas não é para os portugueses que vivem nos países de acolhimento.

Dados referentes a 1998, fornecidos pelo Ministério dos Negócios Estrangeiros, apontam para a existência de 1.256.800 portugueses na Europa e 3.280.388 fora da Europa. Ora, bem vistos estes números, que razões existirão para que dos 4.537.188 emigrantes portugueses (cerca de um milhão são de origem madeirense) apenas 162.612 estejam inscritos no recenseamento eleitoral?
E que apenas votaram nas eleições para a Assembleia da República de 2002, 39.711 (24,42%)?
Nas eleições de 2011 para a Assembleia da República, apenas estavam inscritos 195 111 emigrantes nos cadernos eleitorais (75 053 na Europa e 120 058 fora da Europa). Mas apenas votaram 33 311 (18 191 na Europa e 15 120 fora da Europa) equivalente a 17,7% dos inscritos.

Outro dado anacrónico revela disparidade com os números referidos. É o facto de, na primeira eleição para o Conselho das Comunidades Portuguesas (CCP), realizada em 27 de abril de 1997, estarem inscritos nos Consulados portugueses 2.520.485 emigrantes, tendo apenas votado 34.529. Ou seja, dos quatro milhões e meio de emigrantes, pouco mais de metade está inscrita nos Consulados e podia votar para o CCP, mas somente 178 mil, naquele ano, estavam inscritos no recenseamento eleitoral com direito a voto para a Assembleia da República! No fundo, a realidade da emigração portuguesa tem muito que se diga: baralha os resultados eleitorais quanto à abstenção; os novos emigrantes não se riscaram dos cadernos eleitorais e não votarão nas próximas eleições porque não sentem confiança nos governantes que os aconselharam emigrar. Passos Coelho, em 30/4/2011 garantiu “não cortar mais salários, nem despedir gente” e o seu ministro Miguel Relvas, em 7/1/2012, concretizou: “Se nós olharmos para a nossa história, sabemos que sempre que nos encostaram ao oceano foram os momentos de maior glória da nossa história. A verdade é que nos últimos 20 anos estivemos demasiado preocupados com a Europa (…) Portugal é forte quando olha para o mundo (…) está na hora de sabermos aproveitar essa condição natural dos portugueses, pois foi também por dificuldades que vivemos à época que nós fomos à vida, à procura de outros mundos e de outros mercados”.

De julho de 2011 a junho de 2012 emigraram 65 000 jovens. Nos últimos 4 anos (2011 a 2014) emigraram cerca de 400 000 portugueses. Nestes, estão muitas centenas de madeirenses. O fenómeno nacional e regional é aterrador e pior que a fuga à tropa por causa da Guerra Colonial, entre 1961 e 1974. Com a grave situação da perda constante de população ativa e ausência de nascimentos. A estimativa atual de emigrantes madeirenses e seus descendentes até a terceira geração é cerca de 1 110 000. Em 1960, a população residente na Madeira era de 268 937. O censo de 2011 indica apenas 267 785.




terça-feira, 8 de setembro de 2015

 Da emigração tradicional ao êxodo atual

“Emigrante, vou partir,
Levo uma esperança a sorrir
Dentro do meu coração.
Porque não hei-de cantar
Se vou em busca do pão?!”

1938 - In Canção do Emigrante da Revista «Sol de Inverno».

Com maior ou menor fluxo a Madeira foi sempre terra de emigrantes, quer no conceito tradicional do termo, quer no atual conceito de sazonalidade. Os primeiros são os que, desde o século XVI, procuraram trabalho fora da Madeira. Os segundos são tidos como os que vão trabalhar, por curtos períodos, para países europeus. Hoje, estes últimos transformaram-se já em emigrantes definitivos, porque a Autonomia da Madeira, consagrada constitucionalmente em 1976, não foi capaz de fixar os madeirenses no seu território. Diria que temos uma Autonomia que expulsa a população ativa! Com a adesão de Portugal à União Europeia, o fenómeno da livre circulação de trabalhadores contribuiu para que o conceito de emigrante tomasse outro sentido, embora na prática continuem a existir emigrantes que parecendo sazonais são permanentes. 

Não se pode analisar a Região sem ter em conta o fenómeno emigratório passado e presente. Ele tem reflexos nas remessas financeiras e também na baixa do desemprego. Se tivermos em conta a análise comparativa entre o número de desempregados e de emigrantes ao longo dos tempos, verificamos que, sempre que aumenta o número de pessoas que emigra, baixa a taxa de desemprego. Também a emigração tem efeitos na população residente.
Nas suas memórias, Frei Gaspar da Madre de Deus refere que, por volta de 1525, já havia emigrantes madeirenses na Capitania de São Vicente do Brasil, especialmente empenhados “na introdução e ensino da cultura da cana sacarina” e que “Antão de Leme, madeirense de nascimento, era juíz ordinário” daquela Capitania.
Na «Epopeia do Emigrante Insular», Mota de Vasconcelos refere que em 1753 saíram muitos indivíduos para os Estados Unidos da América, quase sempre clandestinamente, para fugirem “à miséria que afligia a população da Madeira”. E que em 1792 emigraram muitas famílias madeirense para aquele país por causa da perseguição que os mações sofreram nesse ano. Entre 1835 e 1855 saíram da Madeira “cerca de quarenta mil emigrantes com destino ao Brasil e Estados Unidos da América”. E que “a emigração da Madeira para as Ilhas Canecas (Sandwich ou Hawai) teve início em 1878”, bem como “De 1883 a 1887 saíram novas levas de emigrantes para aquelas ilhas distantes, o mesmo sucedendo em 1809 e 1911, e ainda noutros anos”.
A forte emigração de madeirenses para Demerara teria começado por volta de 1840 e seguintes, em cerca de 5 000 por ano. Desde 1842, o governo inglês pagava os transportes, devido à falta de mão-de-obra. Depois de meados do século XIX, a doença nas vinhas tradicionais da Madeira provocaram um grande fluxo de emigrantes para fugirem à fome.
Entre 1939 e 1950 saíram da Madeira 18 772 emigrantes, não por espírito de aventura, mas por necessidades económicas e, durante os treze anos de Guerra Colonial, milhares de jovens emigraram para fugir à guerra, por vezes famílias completas. Um estudo elaborado em 1979 estimou terem emigrado da Madeira, entre 1961 e 1977, 34.100 pessoas, dos quais 20.100 entre 1961 e 1974 (fase da Guerra Colonial).

Os emigrantes de hoje abrangem também jovens licenciados com as mais diversas formações académicas para fugirem à «guerra financeira» e aos ataques ao desenvolvimento e à redução acentuada de salários. O fenómeno é tão grave que é bastante revelador da acelerada decadência da economia da Madeira.