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segunda-feira, 25 de janeiro de 2016

Não sejam coveiros da Autonomia (9)

Assente o que escrevi nos anteriores textos, importa salientar os tipos genéricos de prestações pecuniárias atribuídas a cidadãos. A lei do orçamento de Estado de 2011 (Lei nº 55-A/2010) identificou três tipos de prestações: reformas, pensões, subvenções e outras prestações pecuniárias da mesma natureza. Foi esta lei que, ao criar a «Contribuição Extraordinária de Solidaridade», não poupa as subvenções vitalícias dos ex-titulares de cargos políticos. Estas não são reformas nem pensões, tendo sido abrangidas por aquela contribuição extraordinária.
O artigo 162º daquela lei estabelece que:
“1 - As reformas, pensões, subvenções e outras prestações pecuniárias de idêntica natureza, pagas a um único titular, cujo valor mensal seja superior a (euro) 5000 são sujeitas a uma contribuição extraordinária de 10%, que incide sobre o montante que excede aquele valor.
2 - O disposto no número anterior abrange a soma das pensões e aposentação, de reforma e equiparadas e as subvenções mensais vitalícias pagas pela CGA, I. P., pelo Centro Nacional de Pensões e, directamente ou por intermédio de fundos de pensões, por quaisquer entidades públicas, independentemente da respectiva natureza e grau de independência ou autonomia, nomeadamente as suportadas por institutos públicos, entidades reguladoras, de supervisão ou controlo, e empresas públicas, de âmbito nacional, regional ou municipal. 
3 - A contribuição prevista no presente Artigo reverte a favor da segurança social, no caso das pensões pagas pelo Centro Nacional de Pensões, e a favor da CGA, I. P., nas restantes situações, sendo deduzida pelas entidades referidas no número anterior das pensões por elas abonadas. 
4 - O beneficiário de reformas, pensões, subvenções e outras prestações pecuniárias, a que se refere o n.º 1, presta as informações necessárias para que os órgãos e serviços processadores possam dar cumprimento ao disposto no presente Artigo”.

Por alteração do artº 9.º da Lei n.º 52-A/2005, o artº 172º da  Lei nº 55-A/2010 alterou as regras da cumulação aos “beneficiários de subvenções mensais vitalícias que exerçam quaisquer funções políticas ou públicas remuneradas, nomeadamente em quaisquer serviços da administração central, regional e autárquica, empresas públicas, entidades públicas empresariais, entidades que integrem o sector empresarial municipal ou regional e demais pessoas colectivas públicas. Nestes casos, devem optar ou pela suspensão do pagamento da subvenção vitalícia ou pela suspensão da remuneração correspondente à função política ou pública desempenhada”.
O que estava previsto desde 2005 era apenas o pagamento de um terço da remuneração da função pública exercida desde que fosse aposentado, pensionista, reformado ou reservista, mantendo a pensão.Ou então mantendo a remuneração pela função exercida, acrecida de uma terça parte da pensão de reforma. Isto é, a lei de 2005 não abrangia os beneficiários da subvenção mensal vitalícia, o que só veio a verificar-se a partir da lei do OE 2011.

Esta situação acaba por ser complexa, pelo facto de a Caixa Geral de Aposentações não ter em conta que a Lei 52-A/2005 não se aplicava à Região. Só porque pagava as subvenções dos ex-titulares da Madeira, não faltaram cartas e mais cartas solicitando informações para aplicar a lei. E não faltaram entendimentos estapafúrdios alegando tal aplicação, ignorando, propositadamente e talvez por miopia, o artº 10º da lei de 2005.

O mesmo fadário, penosamente, aconteceu com a aplicação de normas semelhantes encaixadas na lei do OE 2012 (Lei nº 64-B/2011), ao ponto de invocar que errou em contas que fez.
(continua)


segunda-feira, 18 de janeiro de 2016

Não sejam coveiros da Autonomia (8)

Quando a estrutura regional do Tribunal de Contas (TdC) analisou as subvenções vitalícias e os subsídios de reintegração dos ex-titulares de cargos políticos da Assembleia Legislativa da Madeira, relativos a 2011, a sua tarefa fundamental foi, quanto ao enquadramento legal, derivar para a expeculação doutrinária do nº 19 do artº 75º do Estatuto Político-Administrativo da Madeira.
No relatório de 2014, o TdC considerou que a Lei nº 52-A/2005, de 10 de outubro, era aplicada à Região, a partir da sua entrada em vigor, premeditadamente ignorando o artº 10º daquela lei que não prevê tal aplicação. Além disso, também não teve em conta a intenção do legislador quanto aos elementos históricos que fazem parte do Diário da Assembleia da República, de 30/06/2005.
 A especulação teórica do TdC é oposta à que foi produzida pela Assembleia da República:
TdC (Relatório nº 10/2014):
- “Por conseguinte, a remissão constante do nº 19 do artº 75º do EPARAM, deve, nos termos gerais, ser qualificada como uma remissão dinâmica ou formal, pois, a revogação da norma remetida não pode deixar de significar o esvaziamento da remissão”.
- Plenário da Assembleia da República, de 30/06/2005, na discussão da proposta do Governo para revogar as normas da Lei nº 4/85 que dizem respeito às subvenções, a intervenção do deputado do PS, Ricardo Rodrigues, especificou o seguinte:
“Na verdade, por força dos diferentes regimes jurídicos em vigor nas regiões autónomas, nos Açores vigora, neste domínio, o princípio da recepção material, e por isso a presente alteração aplicar-se-á na Região Autónoma dos Açores, enquanto que na Região Autónoma da Madeira vigora, neste domínio, o princípio da recepção formal, pelo que esta alteração, se nada se fizer, não vigorará nesta Região Autónoma”.
- Na edição preparada e comentada pelo deputado José Magalhães ao Estatuto de 1999, é referido o seguinte: “O regime previsto no nº 19, por remissão para legislação concretamente identificada, não é alterado automaticamente quando esta for revista, ao contrário do que decorre da redacção adoptada no nº 2 da disposição homóloga do Estatuto dos Açores”.

Aliás, se fosse a ter em conta o entendimento doutrinário especulativo produzido pelo TdC ao nº 19 do artº 75º do EPARAM, estaríamos perante uma verdadeira revogação daquela norma. A Região ficaria com um Estatuto Político-Administrativo sem um dos elementos essenciais do estatuto remuneratório, na vertente das subvenções e ficaria com uma norma sem efeito prático. Sabendo-se, como sabe ou devia saber o TdC que, segundo a Constituição da República, o estatuto dos titulares de cargos políticos regionais deve fazer parte do Estatuto Político-Administrativo, agiu com uma dupla gravidade: a primeira trata-se de que o TdC não tem competência para produzir entendimentos derrogadores de normas; a segunda tem a ver com o facto de ter ignorado o artº 10º da Lei 52-A/2005.
Apenas com o Orçamento de Estado para 2014, aprovado pela Lei nº 83-B/2013, de 31 de dezembro, o seu artº 78º introduz uma alteração ao artº 10º da Lei 52-A/2005, passando a abranger “Os membros dos Governos Regionais” e “Os deputados às Assembleias Legislativas das regiões autónomas”.
Para bom entendedor, basta ter em conta que se a Assembleia da República – mesmo cometendo um atentado legislativo ao Estatuto Político da Madeira – fez incluir os ex-titulares das regiões autónomas no artº 10º da Lei 52-A/2005, é porque reconheceu, tal como o tinha feito na discussão de 2005, que esta lei não se aplicava às regiões autónomas.
(continua)


segunda-feira, 11 de janeiro de 2016

Não sejam coveiros da Autonomia (7)

Com os pressupostos decorrentes da entrada em vigor, a 15/10/2005, da Lei nº 52-A/2005, de 10 de Outubro, apenas aplicada aos deputados da Assembleia e membros do Governo da República, de acordo com o artº 10º daquela lei, decorreu com a maior normalidade a garantia dos direitos dos ex-titulares de cargos políticos que exerceram a função de deputado na Assembleia Legislativa da Madeira e no Governo Regional.
Face à real interpretação daquela lei, funcionou a norma do artº 75º, nº 19, do Estatuto Político-Administrativo da Madeira. Embora a Caixa Geral de Aposentações, que pagava, até outubro de 2013 (com algumas exceções) as subvenções dos ex-titulares e, depois, outras intituições com a mesma anómala e ignorante interpretação se permitissem fazer interpretações imbecis e abusivas daquela lei de 2005, entenderam-se uns com os outros que ela se aplicava aos ex-titulares da Região, desde a data em que entrou em vigor.
 No entanto, apenas com o Orçamento de Estado para 2014, aprovado pela Lei nº 83-B/2013, de 31 de Dezembro, o seu artº 78º introduz uma alteração ao artº 10º da Lei 52-A/2005, passando a abranger “Os membros dos Governos Regionais” e “Os deputados às Assembleia Legislativas das regiões autónomas”. Ora, se a Assembleia da República – mesmo cometendo um atentado legislativo ao Estatuto Político da Madeira – fez incluir os ex-titulares das regiões autónomas no artº 10º, é porque reconheceu, tal como o tinha feito na discussão de 2005 em relação à Madeira, que a lei não se aplicava à Madeira e aos Açores.

Só passados nove anos é que uma maioria da Asembleia da República, com uma visão míope do valor normativo dos Estatutos regionais - por isso também coveiro da Autonomia - cometeu o crime político de incluir os ex-titulares regionais no artº 10º da lei de 2005. Assim também por não ter em conta o alerta dado pela Assembleia Legislativa da Madeira quando deu parecer na generalidade ao OE 2014, emitido a 05/11/2013. E no parecer na especialidade do dia 20 daquele mês, é referido:
“Reforçamos ainda, neste parecer, que na proposta de OE persistem situações que, por se tratar de matéria constante no Estatuto Político-Administrativo da Região Autónoma da Madeira, não poderão ser objeto de alteração via Orçamento do Estado, sob pena de violação do referido Estatuto Político-Administrativo, merecendo, por esse facto, a nossa total discordância”. E mais adiante o parecer especifica “As subvenções mensais vitalícias (artigo 75º)” e “O regime relativo a pensões e subvenções dos titulares de cargos políticos, conforme artigo 76º - Alteração à Lei nº 52-A/2005, de 10/10”.

A perseguição à Autonomia da Madeira não foi nem é exclusiva da Assembleia da República. Especialmente quando reina uma vontade persecutória contra os direitos dos ex-titulares dos cargos políticos, outras instituições do Estado, usando o seu poder de fiscais da coisa pública, brotam interpretações doutrinárias, mesmo que sejam contraditórias com a letra da lei e ignorando o elemento histórico que esteve na base da aprovação da lei pelo órgão legiferante.

Nos direitos dos ex-titulares dos cargos políticos regionais cabe um conjunto de variantes de diferentes especificidades de acordo com a realidade pessoal de cada beneficiário. Uns estão no grupo do Subsídio de Reintegração. Outros estão abrangidos no grupo da Subvenção Vitalícia, que, por sua vez, abrange os beneficiários que, cumulando a Subvenção Vitalícia com outra reforma, ultrapassam  a Remuneração Base do cargo de Ministro; os que acumulam a Subvenção Vitalícia com Funções  Políticas ou Públicas remunaradas;
(continua)



quarta-feira, 6 de janeiro de 2016

Não sejam coveiros da Autonomia (6)

Decorridos vinte anos da entrada em vigor da Lei 4/85, de 9 de abril, que definiu o estatuto remuneratório dos titulares de cargos políticos, bem como as subvenções vitalícias e subsídios de reintegração, o Governo da República, em 2005, apresentou na Assembleia da República uma proposta de alteração àquela lei visando, de entre algumas alterações, revogar as normas que dizem respeito às subvenções e subsídios de reintegração. A proposta foi discutida no plenário da Assembleia da República no dia 30/06/2005, sendo publicada a 10 de Outubro com o número 52-A/2005.
Mas a nova Lei nº 52-A/2005, ao acabar com as subvenções vitalícias e com os subsídios de reintegração, garantiu o direito aos deputados e membros do governo que já beneficiavam daquelas regalias, bem como aos que estavam em funções até o fim do mandato então em
curso, embora restringindo a contagem do tempo à data da entrada em vigor da nova lei (15/10/2005). É isso que refere o regime transitório estipulado no arº 8º daquela lei:
“Aos titulares de cargos políticos que, até ao termo dos mandatos em curso, prencham os requisitos para beneficiar dos direitos conferidos pelas disposições alteradas ou revogadas pelos artigos anteriores são aplicáveis, para todos os efeitos, aqueles regimes legais, computando-se, nas regras de calculo, apenas o número de anos de exercício efectivo de funções verificado à data da entrada em vigor da presente lei, independentemente da data do requerimento e sem prejuízo dos limites máximos até aqui vigentes”. A contradição desta norma é não contar o tempo de mandato até o fim deste, mas limitado à data da entrada em vigor da lei.

Outra faceta importante da Lei nº 52-A/2005, é não se aplicar aos deputados e membros do Governo Regional da Madeira e dos Açores, conforme resulta do seu artº 10º, ao considerar quais são os titulares de cargos políticos para efeitos da “presente lei”:
“Arttigo 10º Titulares de cargos políticos
Consideram-se titulares de cargos políticos para efeitos da presente lei:
a) Os deputados à Assembleia da República; b) Os membros do Governo; c) Os Representantes da República; d) O Provedor de Justiça; e) Os governadores e vice-governadores civis; f) Os eleitos locais em regime de tempo inteiro; g) Os deputados ao Parlamento Europeu; h) Os juízes do Tribunal Constitucional que não sejam magistrados de carreira”.

É por demais evidente para bom entendedor na interpretração daquela lei, que não só ela expressa, sem margem para outras alucinadas interpretações, a que cargos políticos se aplica, mas também corresponde, em parte, ao querer do órgão legiferante – Assembleia da República, aquando da discussão da proposta de lei apresentada pelo Governo, e que transcrevi na passada semana, o qual repito para que não fiquem dúvidas nas mentes de muitos coveiros da Autonomia:
“Na verdade, por força dos diferentes regimes jurídicos em vigor nas regiões autónomas, nos Açores vigora, neste domínio, o princípio da recepção material, e por isso a presente alteração aplicar-se-á na Região Autónoma dos Açores, enquanto que na Região Autónoma da Madeira vigora, neste domínio, o princípio da recepção formal, pelo que esta alteração, se nada se fizer, não vigorará nesta Região Autónoma”.
Aliás, na edição preparada e comentada pelo deputado José Magalhães ao Estatuto de 1999, é referido o seguinte: “O regime previsto no nº 19, por remissão para legislação concretamente identificada, não é alterado automaticamente quando esta for revista, ao contrário do que decorre da redacção adoptada no nº 2 da disposição homóloga do Estatuto dos Açores”.
(continua)