Pesquisar neste blogue

sábado, 29 de maio de 2021

 

               Conflitos das Autonomias da Madeira (33)

O livro «História da Madeira», coordenado por Alberto Vieira, destaca que o “conceito de regionalismo nasceu em França em 1874, sendo de uso corrente desde 1892 e pretende significar um movimento aberto a diversas correntes políticas e culturais e que actua na defesa dos interesses locais”. Mais refere que o Partido Republicano Português “lutara contra o centralismo lisboeta do poder monárquico e as forças vivas da Madeira estavam cada vez mais conscientes de que a solução dos da ilha passavam por uma autonomia administrativa e económica e que o estatuto autonómico de 1901 estava ainda aquém de corresponder a estes anseios.

Proclamada a República, alguns “filhos órfãos lastimosos” da Monarquia começaram a agitar a bandeira do regionalismo, como forma de oposição ao regime republicano e de intervenção na vida política. A 11 de Outubro de 1910, no Diário de Notícias, o Visconde Gonçalves de Freitas (1836-1915), deputado e Par do Reino, pela Madeira, no tempo da Monarquia, foi a primeira voz a surgir a público: “Nem republicanos, nem monárquicos. Nem ultramontanos, nem liberais. Madeirenses só! Porque a época não é própria para as distinções partidárias, mas para um abraço fraternal entre todas as classes sociais. Há grandes interesses a defender e importantes assuntos a discutir”. A necessidade de reunir esforços “puramente e exclusivamente madeirenses” e insurgia-se contra a verba insignificante que o Governo central enviara para fazer face à epidemia da cólera que surgira no Funchal, porque “a Madeira manda anualmente para os cofres do Estado, depois de feitas todas as despesas distritais, centenas de contos de reis”. Concluiu com um apelo ao fervor do debate e reclamação autonomista: “levantar bem alto a voz de forma que Portugal nos atenda e a Europa nos Oiça”.

A resposta veio de um republicano que assina com as iniciais L.O. P. C., que contrapõe o progresso da Madeira em marcha, dizendo que a sua continuidade depende do contributo dos portugueses, madeirenses ou não. São feitas acusações de chauvinismo e má-fé quanto aos impostos, uma vez que a Junta Geral administra muitas das verbas arrecadadas na Madeira, e de descrença e oposição à governação republicana “que não mente como nos mentiram durante três quartos de século, os governos da monarquia, que sempre nos ludibriaram””.

Mais salienta que “Em entrevista ao jornal O Liberal, a 5 de Junho de 1913. o visconde da Ribeira Brava, que se empenhara, já na Monarquia, na defesa dos interesses da Madeira, e que aderira ao PRP em 1908, exprime bem a esperança republicana: “Por várias vezes durante o antigo regime, tentei fazer alguma coisa de bom pela Madeira; reconheci, porém, que seria impossível lutar pelo proveito e capitulei! Mas, logo que vi proclamada a República, entendi que era a hora de fazer justiça à nossa terra. Durante largos anos a Madeira foi despojada da quase totalidade dos seus rendimentos, enviando milhares de contos, e não recebendo o mais insignificante melhoramento (O Liberal, a 5 de Junho de 1913)”.

“Nos últimos anos tomou vulto a ideia autonómica dos açoreanos e dos madeirenses. Não está ainda suficientemente definida no espírito deles, embora as aspirações estejam completas no ardor e unanimidade. Isto concorre para que na metrópole haja suspeitas e oposições apenas fundadas no descontentamento (…) subentende-se talvez o receio de que os madeirenses queiram juntar-se à Inglaterra (…) A. Quirino de Jesus, Autonomia da Madeira e Açores. in A Pátria, 7 de Julho 1923”.

(continua)

domingo, 23 de maio de 2021

 

Conflitos das Autonomias da Madeira (32)

 

Na descrição que o Elucidário Madeirense, Vol. II, faz dos efeitos que a I Guerra Mundial provocou na Madeira “ecoou sinistra e sangrentamente na capital deste arquipélago com o bombardeamento do nosso porto por submarinos alemães, nos dias 3 de Dezembro de 1916 e 12 de Dezembro de 1917. Os submarinos inimigos percorreram com frequência as águas deste arquipélago e as equipagens de muitas embarcações a vapor e à vela, afundadas por eles, vieram procurar a sua salvação nas costas marítimas destas ilhas. Vamos mencionar algumas dessas embarcações, e ainda outras que foram torpedeadas ou assaltadas em viagem para a Madeira, sendo possível que a nossa relação apresente lacunas sensíveis, sobretudo com respeito ao período em que a imprensa se viu forçada a omitir a narrativa de certas ocorrências de guerra.

A escuna Senhora da Conceição foi afundada por um submarino alemão, nas costas da França, mas pertencia à praça do Funchal e trazia um carregamento de enxofre para esta ilha. Tinha sete tripulantes e um praticante de piloto, natural da Madeira, desembarcando todos no porto de Gijon, em Espanha. O torpedeamento deu-se   no mês de Abril de 1916.

No mês de Julho do ano referido, saiu do Funchal , conduzindo um carregamento de vinho com destino a alguns portos do norte da Europa, o vapor dinamarquês Moskow que foi apresado e afundado pelos alemães, tendo a companhia de seguros Alliança Madeirense pago a importância da carga (…) na freguesia da Ribeira Brava desembarcaram a 17 de Julho de 1917 os marinheiros que tripulavam o vapor grego Chalkidon, que fora afundado por submarino a 80 milhas da Madeira, tinha 23 tripulantes de dirigia-se de New-York para Marselha.

A cerca de 150 milhas da ilha do Porto Santo foi metida a pique a barca portuguesa Viajante, que trazia carga geral para a Madeira. Depois de três dias de extenuante viagem, chegou a equipagem desta embarcação ao Funchal a 5 de Outubro, seguindo alguns dias depois para Portugal (…) a 30 de janeiro de 1918 foi torpedeado o pequeno vapor Neptuno (antigo Maria), pertencente à praça do Funchal. Saíra na véspera de Lisboa com destino a esta ilha.

A 30 de Março de 1918, foi afundada a 100 milhas do Porto Santo a escuna portuguesa Beira Alta, que trazia de Lisboa para a Madeira 20 toneladas de semilhas, além doutra carga.

Aportaram ao Funchal, nos primeiros dias do mês de Abril de 1918, os tripulantes de um veleiro português, que seguia o rumo dos Açores para Lisboa e que fora torpedeado por um submarino (…).

A 24 de Fevereiro de 1916 o decreto que autorizou a apreensão dos navios das nações inimigas surtos nos portos portugueses, encontrando-se então ancorados na baía do Funchal os vapores alemães Colmar, Petropolis, Guahyba e Hochfeld. Em virtude de ordens superiores, o capitão do nosso porto Sales Henriques, acompanhado do comandante da guarda fiscal tenente Leovegildo Rodrigues, procedeu no dia 2 de Março de 1916 à ocupação daquelas embarcações, tendo os respectivos tripulantes, em número de 100, deixando sem demora os seus navios.  Segundo declarações de alguns tripulantes o governo alemão mandou destruir e inutilizar várias peças dos maquinismos, obstando assim a que os navios pudessem navegar, a esses navios foram postos os nomes de Madeira, Porto Santo, Machico e Desertas (…).

O Diário do Governo de 14 de Abril de 1938 publicou uma relação de 62 pessoas residentes no Funchal, vítimas dos prejuízos causados por um submarino alemão, às quais se reconheceu o direito a certas indemnizações no valor total de 46.451$04”.

(continua)

domingo, 16 de maio de 2021

 

Conflitos das Autonomias da Madeira (31)

 A I Guerra Mundial pareceria estar premeditada a virar o ideal de conflitos armados anteriores. Mas a direção seguida pela guerra foi uma fatalidade na destruição de países e mortes no período de duração entre 1914 -1918.

Foi na presidência de Bernardino Machado, em agosto de 1914, que rebentou na Europa a Grande Guerra. Portugal, velho aliado da Inglaterra, entrou na guerra ao lado desta nação, da França e da Bélgica, contra a Alemanha e seus aliados. A paz só teve lugar quatro anos depois pelo armistício de 11 de novembro de 1918, ficando a Alemanha completamente derrotada. Quer nos campos da Flandres, quer em África, os soldados portugueses deram claras provas de bravura. Portugal participou no primeiro conflito mundial ao lado dos Aliados, o que estava de acordo com as orientações da República instaurada quatro anos antes.

Na primeira etapa do conflito, Portugal participou, militarmente, na guerra com o envio de tropas para a defesa das colónias africanas ameaçadas pela Alemanha. Face a este perigo e sem declaração de guerra, o governo português enviou contingentes militares para Angola e Moçambique. “Inicialmente, a Inglaterra insistiu na neutralidade do país português, com a condição de eventualmente realizar pedidos ao estado português para auxiliá-la na guerra. Em março de 1916, a Inglaterra decidiu pedir ao estado português o apresamento de todos os navios alemães e austro-húngaros presentes na costa lusitana. Esta atitude justificou a declaração oficial de guerra a Portugal pela Alemanha, em 9 de março de 1916 (apesar dos combates em África desde 1914). Em 1917, as primeiras tropas portuguesas, do Corpo Expedicionário Português, sob o comando de Tamagnini de Abreu, seguiam para a guerra na Europa, em direcção a Flandres. Portugal envolveu-se, depois, em combates em França. (…) Neste esforço de guerra, chegaram a estar mobilizados quase duzentos mil homens. As perdas atingiram quase dez mil mortos e milhares de feridos, além de custos económicos e sociais gravemente superiores à capacidade nacional. Os objectivos que levaram os responsáveis políticos portugueses a entrar na guerra saíram gorados na sua totalidade. A unidade nacional não seria conseguida por este meio e a instabilidade política acentuar-se-ia até à queda do regime democrático em 1926” (…) Nenhuma outra guerra mudou o mapa da Europa de forma tão dramática. Quatro impérios desapareceram após o fim do conflito: Alemão, o Austro-Húngaro, o Otomano e o Russo. Quatro dinastias, juntamente com as aristocracias que as apoiavam, caíram após a guerra: os Hohenzollern, os Habsburgos, os Romanov e os Otomanos. Países como a Bélgica e a Sérvia passaram por destruições severas, assim como a França, que perdeu 1,4 milhão de soldados, sem contar as vítimas civis. A Alemanha e Rússia foram igualmente afetadas (…) A guerra teve consequências econômicas profundas. Dos sessenta milhões de soldados europeus que foram mobilizados entre os anos de 1914 e 1918, oito milhões foram mortos, sete milhões foram incapacitados de maneira permanente e quinze milhões ficaram gravemente feridos. Morreram 6 milhões de civis durante a guerra. A Alemanha perdeu 15,1% de sua população masculina ativa, a Áustria-Hungria perdeu 17,1% e a França perdeu 10,5%”. (in wikipedia).

A Grande Guerra provocou na Madeira perdas humanas e materiais, incluindo bombardeamentos feitos por submarinos alemãs e afundamento de navios que transportavam mercadorias de e para a Madeira, como veremos no próximo texto.

(continua)

domingo, 9 de maio de 2021

 

               Conflitos das Autonomias da Madeira (30)

 

No dia 12 de dezembro de 1913, a Junta Geral do Distrito do Funchal elaborou as «Bases do concurso para a construção e exploração da rêde ferro-viária na ilha da Madeira». O preâmbulo refere que “A Junta Geral do Districto do Funchal, tendo obtido da Câmara Municipal do Funchal, a cedência do seu direito para construir e explorar ou conceder a construcção de Viação Electrica nas suas estradas municipaes e ruas da cidade, resolve ao abrigo do que dispõe o artigo 147 nº 2 do decreto com força de lei de 24 de Março de 1911 e respectivo regulamento de 31 de Novembro de 1911, abrir concurso pelo prazo de 90 dias para a construção e exploração da rede ferro-viaria das ruas e estradas da cidade do Funchal, bem como das estradas denominadas Nacionaes, mas pertencentes à Junta Geral do Districto”.

Nas condições concernentes e à construcção consta que “A viação electrica será estabelecida, de obrigação, desde já nas estradas Nacionaes nºs 25 e 26 de São Vicente à Ribeira Brava, nº 23 da Ribeira Brava até Machico atravessando a cidade sobre a avenida que da Ponte Monumental seguirá até a Porta da Sé  e d´ahi pelas estradas que ligarem este ponto com a Estrada do Conde Carvalhal; e nas outras estradas, à medida que forem  construídas. Da via estabelecida nos pontos referidos partirão ramais destinados ao serviço da cidade, e que farão parte d`um projecto de rede a elaborar pelo concessionário com a aprovação da Junta, sendo desde já considerado como de obrigação o assentamento da via e respectiva exploração, nas estradas que ligam as freguesias ruraes com a rêde urbana do concelho do Funchal”.

“Ao concessionário é reservado o direito de estabelecer a viação electrica em qualquer das estradas Nacionaes pertencentes à Junta Geral do Districto. A construcção e assentamento das linhas deverá ser de forma que não embarace o transito de passageiros e vehiculos de qualquer especie ficando os carris ao nível das calçadas, de modo que não apresentem qualquer saliência.

A velocidade dos carros será regulada por um diploma emanado da repartição technica da Junta em harmonia com as leis especiaes referentes ao assumpto e conforme os usos adaptados em outras capitães. As linhas serão em regra construídas para uma só via, á excepção do pontos de cruzamentos em que se julgue preciso estabelecer desvios, não devendo a segunda linha exceder quarenta metros (…) o material circulante tanto para passageiros como para mercadorias será suspenso sobre molas, da melhor qualidade e solidamente construído. As carruagens para passageiros serão dos melhores modelos adoptados em caminhos de ferro d`esta natureza e offerecerão as necessárias garantias de conforto e segurança, sem portas que abram para fóra”.

O caminho de ferro com todos os seus edifícios e acessórios necessários para o serviço, incluindo oficinas, material fixo e machinas de qualquer natureza, ficam desde a sua construção ou colocação pertencentes ao domínio da Junta Geral para todos os effeitos jurídicos, nos termos do direito commum e especial de caminhos de ferro e das diversas condições do contrato.

A Junta Geral concede ao concessionario por espaço de 75 annos a contar da data da aprovação do contrato o direito da construção e exploração do mencionado caminho de ferro (…) o concessionário fica sujeito para os efeitos da construção da linha e produção de energia electrica, ao decreto com força de lei de 24 de Maio de 1911.

Funchal, 12/12/1913 General Daniel Telo Simões Soares. Ribeira Brava – João Augusto Pina.”

(continua)

quinta-feira, 6 de maio de 2021

 

               Conflitos das Autonomias da Madeira (29)

À medida que o povoamento e a exploração do território das diversas localidades da Madeira foram desenvolvidos, os acessos ao seu interior proliferaram em extensão e qualidade. Foi beneficiado o abastecimento de bens às populações e proporcionou o escoamento por mar dos bens produzidos. As caraterísticas da orografia da Madeira dificultaram a construção das vias de acesso de e para os lugares mais recônditos. Essas condições desfavoráveis não impediram a árdua tarefa de abrir caminhos ao longo das íngremes encostas, factos tão expressivos que atribuem valor acrescentado ao papel que ao longo dos tempos a rede viária teve no desenvolvimento social e económico da Região.

São visíveis as então designadas «Estradas Reais» e «Estradas Nacionais» após o regime republicano, umas encontram-se conservadas e muito utilizadas na circulação de pessoas, embora outras encontram-se em total degradação. Aquelas estradas, também conhecidas por «Caminhos Antigos», constituem um valor patrimonial incalculável, ainda tendo em conta que não podemos falar de rede viária regional sem tratar das «Estradas Reais».

O regime jurídico do património cultural português prevê a possibilidade das entidades públicas protegerem bens culturais imóveis, embora não mencionando expressamente as antigas vias de comunicação. Esse facto não invalida que se estenda o conceito de património cultural a essas vias de circulação, cujas caraterísticas são específicas da Madeira.

Dado o valor cultural daquelas antigas vias, foi apresentado na Assembleia Regional em 31 de janeiro de 1989 pelo Grupo Parlamentar do PS-Madeira um projeto de decreto legislativo regional propondo que as mesmas fossem classificadas património de valor histórico-cultural, independentemente de em algumas apenas existirem partes em condições de circulação. Previa-se que a sua classificação fosse de valor regional ou local de acordo com o seu âmbito de inserção. As entidades intervenientes teriam em conta os respetivos planos urbanísticos futuros e inscreveriam anualmente nos seus orçamentos as verbas necessárias à proteção daquelas vias. E para cumprimento das despesas com verbas orçamentadas os órgãos competentes poderiam solicitar apoio técnico e financeira aos organismos vocacionados na defesa do património cultural.

Discutido o projeto no plenário da Assembleia Regional no dia 14 de julho de 1992, o mesmo foi rejeitado pelos deputados do PSD que tinha maioria absoluta, mas com uma precária e retrógrada mentalidade cultural e política pelo facto de ter votado contra apenas por o projeto ter sido apresentado pelo PS.

No entanto, em 8 de março de 2016, os secretários regionais dos Assuntos Parlamentares e Europeus e do Ambiente e Recursos Naturais assinaram o Despacho conjunto nº 31/2016 criando uma comissão encarregue de proceder ao “levantamento do denominado “Caminho real da Calheta”, com a finalidade de identificar o traçado do caminho real, o seu estado atual, bem como as obras necessárias à sua recuperação, com indicação da estimativa dos custos previsíveis”. No preâmbulo do despacho é referido: (…) neste sentido, consciente da importância deste legado, constitui desiderato do Governo Regional da Madeira a concretização do projecto de recuperação da rede de “caminhos reais da Região Autónoma da Madeira, permitindo a salvaguarda e valorização do património regional (…) e aproveitamento do seu potencial económico para o desenvolvimento local (…)”.

(continua)

 

Conflitos das Autonomias da Madeira (28)

Para a obra de construção do porto do Funchal, a portaria de 8 de dezembro de 1911 criou a comissão para estudar o início das obras. A lei nº 89, de 13 de agosto de 1913 estabelece a Junta Autónoma das Obras do Porto do Funchal, que só será regulamentada através da portaria de 27 de novembro de 1915. As obras abrangiam: a ampliação e reparação do porto e armazéns para apoio desde; obras do cais da cidade; construir uma avenida entre o porto e o cais. Em 1923 as obras foram adjudicadas à empresa «Fumasil», tendo sido rescindido o cotrato no ano de 1928.

Outra obra resultante de plano anterior foi a rede telefónica, cujas obras iniciaram-se no ano de 1909 e inaugurada em 1911. A extensão às zonas rurais deu-se em 1920 e passou a integrar o serviço externo desde 1922 com a telegrafia sem fios (TSF), dando continuidade ao serviço instalado na Quita Santana pelos ingleses da altura da guerra.

Outra obra importante foi o abastecimento de água ao Funchal, cujo projeto estava previsto desde os finais do século XIX., sendo o concurso público realizado em 1908.

No que à rede viária regional diz respeito, na sequência de construções rudimentares de acesso da área costeira ao interior das povoações, foi constituída no tempo da Monarquia uma rede de «estradas reais» que passaram chamar-se «estradas nacionais» após a implantação da República, classificadas seguintes números 23, 24, 25, 26, 27, 28.

A maior parte das Estradas Reais surgiu por iniciativa dos governadores ou dos capitães-generais como complemento às ligações marítimas. “Estas 'estradas reais' fazem parte da nossa memória coletiva da Madeira e, acima de tudo, porque são exemplo da grande dificuldade que foi construir uma ilha do nada”, destaca Miguel Gouveia numa nota de imprensa onde recorda que várias localidades na Madeira cresceram e assumiram importância em torno das rotas de circulação terrestre que funcionavam como pontos de apoio aos viajantes, fossem eles locais, comerciantes ou estrangeiros.

As estradas reais foram criadas a partir da segunda metade do Séc. XIX, justamente como forma de melhorar a rede viária madeirense no transporte de pessoas e mercadorias. O primeiro troço foi construído em 1867, entre a Alfândega e a Pontinha, numa obra da Estrada Real 23 que dá a volta à ilha da Madeira pelo litoral. Foram seis as estradas reais então construídas:
- Estrada Real 23 (181 km): Funchal, Câmara de Lobos, Quinta Grande, Campanário, Ribeira Brava, Tábua, Ponta do Sol, Madalena do Mar, Arco da Calheta, Calheta, Estreito, Prazeres, Fajã da Ovelha, Ponta do Pargo, Achadas, Porto Moniz, Ribeira da Janela, Seixal, São Vicente, Ponta Delgada, Boa Ventura, Arco São Jorge, Santana, Faial, São Roque do Faial, Porto da Cruz, Machico, Santa Cruz, Porto Novo, Caniço, São Gonçalo, Funchal;
-Estrada Real 24 (35 km): Funchal, Monte, Poiso, Ribeiro Frio, Cruzinha e Santana;
-Estrada Real 25 (39 km): Funchal, São Martinho, Estreito de Câmara de Lobos, Jardim da Serra, Encumeada, Rosário e São Vicente;  

-Estrada Real 26 (13 km): Ribeira Brava, Serra de Água, Encumeada, São Vicente;
-Estrada Real 27 (36 km): Funchal, Santo António, Curral das Freiras, Boaventura;
-Estrada Real 28 (25 km): Ponta do Sol, Cruzinhas, Encumeada, beira do Paul da Serra, Ruínas das Casas do Paul, Estanquinhos, Caramujo, Feiteiras (São Vicente).

(continua)

 

Conflitos das Autonomias da Madeira (27)

A implantação da República teve aceitação da população rural madeirense de forma lenta e pouco entusiasta. “A forte influência dos caciques monárquicos (líderes dos partidos monárquicos), com apoio do clero, dificultaram a penetração da propaganda republicana. Em Santana a República só foi proclamada a 1 de Fevereiro de 1911 com a intervenção de um pelotão da Companhia de Caçadores 6. No Estreito de Câmara de Lobos tal só viria a acontecer no mês seguinte. Em Machico, desde as 23 horas do dia 11 de Dezembro de 1910 até o amanhecer do dia seguinte, a bandeira monárquica voltou a ser hasteada no forte de S. João Baptista pelos amotinados contra a instalação naquela Vila de um hospital de isolamento de doentes de cólera. A epidemia, que já provocara muitos mortos em 1856 e em 1905-6, reacendeu-se a 20 de Outubro de 1910 no Funchal, propagando-se a algumas povoações da Madeira, como Machico. O povo, desesperado e ignorante, incitado por fanáticos anti-republicanos, reagiu saqueando também a casa do Delegado de Saúde, na altura ausente em Lisboa, o Dr. António Balbino do Rego, acusado de andar disfarçado pela calada da noite a envenenar as águas por toda a ilha, causando assim a doença”. («História da Madeira», Coordenação de Alberto Vieira, pag.287, setembro de 2001).

A citada «História da Madeira» revela que em 1910 a cólera morbus motivou a morte a 556 madeirenses (210 no Funchal 161 em Câmara de Lobos, 71 na Ponta do Sol, 75 em Machico, 26 em Santa Cruz e 13 no Porto Santo. No ano de 1856 a totalidade de óbitos tinha sido de 4 700, sendo  2014 no Funchal, 532 em Câmara de Lobos, 281 na Ponta do Sol, 319 em Machico, 716 em São Vicente, 510 na Ribeira Brava, 328  na Calheta e 13 no Porto Santo.

Mais refere que “O regime republicano foi gerando paulatinamente entusiasmo e esperança junto da população, através das reformas realizadas nas áreas social e laboral. A legislação anti-clerical, decretada pelo Governo Provisório da República (Outubro de 1910 – Agosto de 1911), nomeadamente a extinção das Ordens Religiosas e o confisco a favor do Estado dos seus bens, radicalizou as posições pró e contra a República. Também na Madeira os edifícios dos conventos foram ocupados pelo poder civil. O Colégio dos Jesuítas passou a ser um aquartelamento militar e o Convento das Mercês foi convertido em Cadeia.

O encerramento da Congregação das Irmãs Franciscanas de Nossa Senhora das Vitórias (…) pouco tempo antes reconhecida oficialmente pelas autoridades, foi muito criticado e notado. A sua fundadora, a cidadã britânica Mary Jane Wilson, tendo-se recusado a deixar o hábito religioso, como ordenava a nova legislação, foi presa e compelida a deixar a Madeira, rumo à sua terra natal, só regressando a 1 de Novembro de 1911 (…). A luta anti-clerical começou por aproveitar os edifícios religiosos, que nacionalizou, para instalação de serviços públicos. Foi o que se passou por exemplo em relação aos conventos das Mercês e de Santa Clara, o Seminário para Escola de Belas Artes (1913), o Paço Episcopal para o Liceu do Funchal (1913). A isto acresce a instabilidade política e as sucessivas quedas de Governo que dificultaram a concretização de projectos e a realização de obras várias vezes planeadas.

A grande iniciativa de vulto foram as obras do porto do Funchal, com adiamento. Uma portaria de 8-12-1911 criou uma comissão de estudo para o início das obras. A lei nº 89 de 13/8/1913 estabelece a Junta Autónoma das Obras do Porto do Funchal, que só será regulamentada através da portaria de 27 de Novembro de 1915”.

(continua)