Os incêndios e a negligência das Câmaras e do Governo Regional
Os incêndios recorrentes que reduzem a cinzas muitos hectares
de terra e consomem habitações na Região Autónoma da Madeira são a prova da
negligência grosseira das câmaras municipais e do governo regional, por não
elaborarem planos municipais de limpeza de terrenos florestais, incultos e os
que circundam habitações. O que, na semana passada, se passou na freguesia do
Monte, com o Hospital dos Marmeleiros e a igreja do Monte ameaçados pelo incêndio
que esteve tão próximo, constitui mais uma prova de que temos irresponsáveis
políticos em matéria de prevenção contra incêndios, cuja sistemática
negligência transforma-se em verdadeiro crime.
Repito o essencial
do que, em 03/08/2012, aqui escrevi. Na Madeira, para além do dever dos
proprietários, as entidades com competência para prevenirem os incêndios são a Direcção Regional de Florestas, quando se trata de terrenos florestais, terrenos incultos e
terrenos agrícolas situados no interior de terrenos florestais ou incultos ou
até 300 metros
da sua periferia, e as Câmaras Municipais, nas restantes áreas do respetivo território. Como é
visível, nem os proprietários privados nem públicos limpam os seus terrenos.
Mas podem aquelas entidades notificar os privados para procederem a limpezas
que forem necessárias. É obrigatória a limpeza de uma faixa de 50 metros à volta de
edificações, de acordo com a lei nacional de 2006, ou 30 metros , conforme
estabelece o decreto legislativo de agosto de 1998. O que a lei não diz é quem
notifica o governo regional e as câmaras municipais para procederem à limpeza
das suas propriedades!
E
se os proprietários não respeitarem a notificação da Direcção Regional de
Florestas e do município? Neste caso, na respetiva área geográfica de
competências, aquelas entidades procedem à limpeza a apresentam a conta, desde
que fundamentem haver risco de incêndio. A lei regional também estabelece que “O documento da entidade competente com o respectivo selo
branco que discrimine os custos (…) constitui título executivo para efeitos do
disposto no artigo 46º ,
alínea d), do Código de Processo Civil ”. Por isso, é falso o argumento que alguns (ir)responsáveis públicos
invocam não se poder entrar na propriedade privada para proceder a limpezas.
Apesar
da complexidade que se levanta com a questão de saber quem é o proprietário ou
proprietários de determinado prédio rústico composto de árvores ou matos, a
carecer de limpeza, a verdade é que reina a neglicência grosseira daquelas
entidades, mesmo quando o dono é conhecido. A verdade é que, politicamente,
retira votos notificar, limpar e apresentar a conta e, não havendo pagamento,
promover a execução judicial. É por isso que, ou por ignorância ou por
oportunismo político, os candidatos às próximas eleições autárquicas não têm
esta matéria na agenda da campanha eleitoral.
Outro
problema grave é o facto de não haver ordenamento florestal, apesar de
prometido há trinta anos. Este facto, associado à
mudança de hábitos da população, ao abandono natural da agricultura e à
emigração, ampliou a falta de limpeza dos terrenos agrícolas e florestais,
estando bem patente aos olhos de quem quer ver que, por si só, a maioria dos
proprietários privados não tem possibilidade de contratar trabalhadores para a tarefa
da limpeza.
A
limpeza dos matagais e florestas, a começar pelas zonas mais sensíveis e
prioritárias, só poderá ser concretizada se for implementado pela administração
regional e local um plano plurianual de prevenção contra incêndios, de
preferência baseado num plano local de prevenção, utilizando verbas previstas
no PRODERAM para a fileira florestal e outras fontes de financiamento.
Algum
dinheiro tem sido gasto na prevenção de incêndios. Mas muito mais em projetos
de plantação de milhares de árvores e na compra de material de combate aos
incêndios, mas pouco ou nenhum foi utilizado na limpeza da floresta e de
matagais, tanto mais que não existem estruturas com esta função específica.
Os municípios
poderiam e deveriam ter um papel preponderante nesta matéria. Bastava que os eleitos locais tivessem a
consciência de que não foram eleitos apenas para promoverem obras de “encher o
olho”, mas deveriam promover a elaboração de um plano estratégico de todas as
áreas passíveis de, com os incêndios, ficarem seriamente afetadas.