De Distrito do Funchal a Região Autónoma (3)
O
Estatuto do Distrito Autónomo do Funchal atribui ao Distrito a qualidade de
“pessoa moral de direito público, dotado de autonomia administrativa e
financeira”.
O órgão
da administração distrital era a Junta Geral que tinha várias atribuições no
tocante à administração dos bens, coordenação económica, obras públicas,
viação, educação, cultura e polícia,
podendo arrecadar receitas provenientes de impostos do Estado. O Presidente da Junta Geral era
nomeado, por quatro anos, pelo Governador Civil, que representava o Governo da Nação,
ficando a seu cargo a “gestão dos interesses políticos e administrativos do
Estado, a superintendência na polícia geral e a inspecção e fiscalização
tutelar da administração distrital
autónoma”.
O
Governador Civil tinha poderes para suspender as deliberações da Junta Geral e
da Comissão Executiva quando as “considere gravemente lesivas do interesse
geral”. Podia, por delegação ministerial e ouvida a Junta Geral, elaborar
“regulamentos legislativos sobre quaisquer matérias não reguladas por lei ou
decreto, ou quando os regulamentos do Governo não sejam aplicáveis aos distritos autónomos”. Esses regulamentos legislativos
deveriam ser publicados no Diário do Governo e por editais afixados nos lugares
de estilo como era o caso do Regulamento Policial.
O
modelo baseado num distrito, dito autónomo, mais não era senão uma ficção de
autonomia, pois o povo não tinha o poder de escolher os governantes regionais e
autárquicos, que eram paus mandados do Poder Central. Entretanto, o «Estado
Novo» de Salazar, aos poucos perdeu credibilidade de tal modo que nem a
«primavera marcelista» o salvou, mantendo as eleições numa verdadeira farsa
política. As reivindicações por mais autonomia não pararam, assim como as
revoltas do povo também não. Os exemplos da «Revolta das Águas» na Calheta
(Lombo do Atouguia), em 23 de junho de 1953, e na Lombada da Ponta do Sol, em 21
de agosto de 1962, refletem a prepotência política contra o povo. Alguns órgãos
de comunicação social, nomeadamente o «Comércio do Funchal», procuraram por
todos os meios desviar a atenção dos censores, promovendo a contestação às
políticas seguidas.
Chegado
há pouco tempo para exercer as funções de Governador Civil, Braamcamp Sobral
foi presenteado, em 15 de maio de 1969, com um documento subscrito por trinta e
nove madeirenses, estando em primeiro lugar o Dr. António Loja, em que relatam
a situação política, económica e social da Região e solicitam diálogo e mais
abertura do regime.
Braamcamp
Sobral foi exonerado, a seu pedido, no dia 20 de fevereiro de 1974, tendo sido
substituído por Daniel Farrajota Rocheta, que chegou à Madeira no dia 14 de
março daquele ano. Apanhado pela «Revolução do 25 de Abril», Farrajota Rocheta
não teve tempo de aquecer a cadeira por ter sido demitido pela Junta de
Salvação Nacional, através do Decreto-Lei
nº 174/74 , de 25 de Abril.
A Revolução de 1974 manteve a estrutura administrativa, composta pelo
Governador Civil e pela Junta Geral, embora com novos protagonistas e com outra
estrutura entretanto criada: primeiro, a Junta de Planeamento da Madeira e, em
sua substituição, a Junta Administrativa e de Desenvolvimento Regional,
abreviadamente designada Junta Regional. Com três estruturas de Poder a
funcionarem em sinultâneo, a finalidade era adaptar o muribundo Distrito ao
novo figurino administrativo da Região, que seria consagrado na Constituição da República .
A Junta de Salvação Nacional
convidou o Tenente-coronel de Cavalaria Carlos Azeredo como seu delegado na Madeira,
acabando por acumular as funções de Comandante Militar com as de Governador do
Distrito, desde o dia 2 de maio de 1974 até a tomada de posse do Dr. Fernando
Rebelo, no dia 12 de agosto de 1974, no Palácio de S. Lourenço, após ter sido
nomeado pelo Ministro da Administração Interna, Costa Braz, do II Governo
Provisório. A Portaria de nomeação, datada do dia 7 de Agosto e publicada no
dia 9, consumou, assim, a subida àquele cargo de uma personalidade civil,
figura de relevo do movimento democrático no tempo do Estado Novo, e que havia
sido candidato às eleições para deputados à Assembleia Nacional, em outubro de 1969. A nomeação do Dr.
Fernando Rebelo teve em conta a “conveniência urgente de serviço público”.
Apesar de aparentemente tudo normalizado, o Dr. Fernando Rebelo não teve
tarefa fácil. Teve de intervir em todos os acontecimentos perturbadores da vida
política e social, bem como na nomeação de novas figuras para as Câmaras
Municipais e para a Junta Geral. Por isso, foi permanente a acção crítica das
organizações políticas e outras ao novo Governador. O sindicato da Construção
Civil foi ágil em promover manifestações contra a sua atuação, como foi a que
teve lugar no dia 21 de outubro de 1974. Em meados de novembro daquele ano, foi
desejo do Dr. Fernando Rebelo deixar o cargo e demitiu-se. Mas a sua saída
definitiva só se concretizou em março do ano seguinte, passando o lugar ao
Brigadeiro Carlos Azeredo que tomou posse no dia 23. O mais curioso foi o facto
de o Dr Fernando Rebelo ser político de esquerda, e quem mais o criticou foram
precisamente os partidos de esquerda. Talvez pelo facto de o Governador do
Distrito não ter aderido a nenhum deles. Apenas teve a solidariedade do “seu”
MDM – Movimento Democrático da Madeira.