Região Autónoma sem
expressa referência à autonomia financeira
Pese embora o contínuo reforço do poder centralizador do
Estado Novo, o Estatuto do Distrito Autónomo prevê, expressamente, a autonomia
financeira do Distrito, o que não acontece com a Constituição de 1976. Só a
expressa referência, nos artigos 229º e 233º, aos poderes regionais quanto aos
seus planos e respectivos financiamentos, bem como a competência exclusiva da
Assembleia Regional para aprovar o Orçamento e o Plano Económico Regional, é que,
tacitamente, as Regiões Autónomas teem autonomia financeira.
De “pessoa moral de direito público”, prevista no
Estatuto do Distrito, a Constituição de 1976 define as regiões autónomas como
“pessoas colectivas de direito público” com órgãos de governo próprio,
consubstanciados num órgão legislativo - a Assembleia Regional - e um executivo
- o Governo Regional.
Não restam dúvidas de que fica consagrada uma forma
descentralizada de poder legislar por parte da Assembleia Regional “em matérias
de interesse específico para a região que não estejam reservadas à competência
dos órgãos de soberania e não meramente regulamentar” - alínea a) do nº 1 do artº 229º.
A Assembleia Regional também fica com o poder de iniciativa legislativa
e de apresentar propostas de lei à Assembleia da República - alínea c) do nº 1
do artº 229º.
A Constituição de 1976 integra na competência da
Assembleia Regional e não na do Governo Regional, que é politicamente
responsável perante aquela, a regulamentação das “leis gerais emanadas dos
órgãos de soberania que não reservem para
estes o respectivo poder
regulamentar”. E na competência do Governo Regional apenas a regulamentação dos
decretos regionais, hoje decretos legislativos regionais - alínea b) do nº 1 do
artigo 229º.
O que aconteceu
muitas vezes foi o facto de o Governo Regional ter aplicado à Região
decretos-leis por portaria regional ou por decreto regulamentar.
A Assembleia Regional pode solicitar ao Conselho da
Revolução (extinto com a revisão da Constituição de 1982) “a declaração de
inconstitucionalidade de normas jurídicas emanadas dos órgãos de soberania, por
violação dos direitos das regiões consagrados da Constituição” - nº 2 do artº
229º. Mas um grupo de deputados da Assembleia Regional não pode pedir ao
Tribunal Constitucional a verificação da legalidade/constitucionalidade de
diplomas regionais, ao contrário do que acontece na Assembleia da República.
Ao contrário do que sucede com a Assembleia da Republica
poder delegar, por lei, competência legislativa no Governo da República, a
Assembleia Regional não tem, ainda hoje, competência semelhante. O Governo
Regional apenas regulamenta, por decreto regulamentar regional, os decretos
regionais.
Apesar
do novo figurino da autonomia, a sua amplitude tem restrições expressas no
texto constitucional com a inclusão de normas bastante limitadoras que criam um
sistema que complicou a elaboração dos mesmos, bem como no âmbito do respeito
pelas restantes limitações:
-
Uma delas é a que prevê (artigo 228º) que o Estatuto Politico-Administrativo
seja elaborado pela Assembleia Regional e remetido à Assembleia da República
para ser de novo discutido e aprovado. Se for rejeitado, volta de novo à
Assembleia Regional.
-
Outra limitação é a que cabe exclusivamente à Assembleia da República aprovar a
lei eleitoral para as eleições regionais.
-
Outra restrição no poder da Região Autónoma tem a ver com o facto de qualquer
lei regional aprovada ter de respeitar a Constituição da República , como é logicamente
aceitável. Mas a limitação de respeitar as leis gerais da República é que, pela
formulação genérica imposta, viria, ao longo dos anos, criar dúvidas quanto à
falta de uma definição correcta do que era e que caraterísticas materiais tinha
uma lei geral.
As alterações à Constituição promovidas
em 1982, 1989, 1997 e 2004 trataram de matérias vastas e em vários domínios
normativos, alguns destes com reflexos nas Regiões Autónomas. A revisão de 1992
incidiu apenas em seis artigos para permitir essencialmente a ratificação do
Tratado de Maastricht e atualizar o artigo 284º que trata precisamente do tempo
de revisão constitucional.
A revisão de 2001 incidiu em seis
artigos tendo em conta a aceitação da jurisdição do Tribunal Penal
Internacional, embora acrescente um nº 3 ao artigo 11º referindo que a “A
língua oficial é o Português”.
A revisão de 2004 acabou com as famigeradas leis gerais
da República que, apesar do larguíssimo debate, não tinha sido possível
clarificar o seu conceito na revisão de 1989. Também estabeleceu que, com a
revisão do Estatuto Político-Administrativo, desapareceria o conceito de
«matérias de interesse específico», descritas no artigo 40º.
A revisão de 2005 apenas aditou o artigo
295º, prevendo a possibilidade de convocação de referendo sobre a aprovação de
tratado que “vise a construção e aprofundamento da união europeia”.
TM, 10-10-2014
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