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segunda-feira, 28 de junho de 2021

 

               Conflitos das Autonomias da Madeira (37)

A implantação do regime republicano permitiu a Sidónio Pais aceder e acumular outros cargos para além da docência, numa primeira fase e, depois, uma via política. Ascende a presidente da Comissão Municipal de Coimbra e, no final de 1910, pela mão de Brito Camacho, pertence ao Conselho de Administração dos Caminhos-de-Ferro, abandonando a municipalidade de Coimbra. A 23 de outubro de 1910 são nomeados Manuel de Arriaga e Sidónio Pais para os cargos de reitor e vice-reitor da Universidade de Coimbra.

Numa conjuntura de grande agitação política e estudantil, com a invasão das aulas e perseguição de lentes tidos como franquistas e reacionários, foi necessário lançar as bases da exigida reforma da Universidade. Foi com Manuel Arriaga e Sidónio Pais que foram promulgados quatro emblemáticos decretos da desejada nova academia, tendo sido abolido o juramento de lentes e alunos, nomeadamente o juramento da Imaculada Conceição; as matrículas no 1º Ano de Teologia foram anuladas, foi abolida a obrigatoriedade do uso de capa e batina e foram extintos os privilégios dos «Velhos Estatutos». Os cursos das Faculdades foram tornados livres, sem marcação de faltas, o que traduzia uma modernização da conceção do ensino superior.

“Em fevereiro de 1911, Sidónio Pais faz a sua iniciação maçónica em Coimbra, na Loja Estrela de Alva do REAA-Rito Escocês Antigo e Aceite, escolhendo o nome simbólico de Carlyle (1795-1881), historiador, crítico da sociedade e filósofo escocês. Muito se tem dito sobre esta escolha, aventando-se a hipótese do trabalho de Carlyle, nomeadamente o texto ON Heroes (…) ter tido influência sobre Sidónio Pais. Ou seja, ter moldado a sua maneira de encarar o processo histórico e o papel central que nele tinham os heróis, nomeadamente o «rei». A sua iniciação pode significar a necessidade de legitimação política, face a outros republicanos, também maçónicos, mas mais activos politicamente ou mesmo «revolucionários».

Novas oportunidades levam Sidónio Pais a abandonar Coimbra. Em Maio de 1911 é eleito deputado à Assembleia Nacional Constituinte pelo círculo nº 15, Aveiro. Sidónio Pais não se distinguiu como tribuno, nem teve intervenções extensas e inspiradas. Foi, portanto, um deputado participativo mas discreto, que alinhava com o republicanismo moderado de Brito Camacho, que viria a ser o chefe do Partido Unionista. Defendeu a existência de duas câmaras e recusou a ideia de um Senado «corporativo», temendo que este se tornasse conservador.

Através da influência de Brito Camacho, Sidónio Pais faria parte do primeiro elenco governativo, presidido por João Chagas. O político unionista explicou porque é que pugnara pela colocação do seu correligionário na pasta que ocupara no Governo Provisório: «Unicamente por ser meu amigo? Não; porque sendo S. Exª. uma inteligência superior e superiormente culta, e ao mesmo tempo um nobre carácter, tinha a certeza de que havia de adoptar; do que eu fizera, aquilo que achasse bom, e havia de corrigir com superiores vantagens aquilo que achasse mau».

Sidónio Pais ocupou, assim, a pasta do Fomento, no I Governo Constitucional, presidido por João Chagas. Era constituído por republicanos moderados que tinham sobre os ombros a tarefa de «consolidar a República». Tratava-se, portanto, de um gabinete do qual muito se esperava. A conjuntura política, (…), não permitiu que os projectos gizados fossem levados a bom porto por Sidónio Pais” (Presidentes de Portugal, Museu da Presidência da República, janeiro 2006).

(continua)

domingo, 20 de junho de 2021

 

               Conflitos das Autonomias da Madeira (36)

 

“A luta pela Monarquia tradicional, ordeira e elitista, fá-lo dar aval às ditaduras de Pimenta de Castro (Janeiro-Maio 1915), Sidónio Pais (1917-1918) e mais tarde à Ditadura Militar e ao Governo do Estado Novo de Salazar e a simpatia pelo nazismo.

O empenho na defesa pelos interesses da Madeira continuou no semanário Independência (1928-1929) e ainda na Revista Portuguesa e Ilustração Portuguesa, durante o Estado Novo. O período da Ditadura de Sidónio Pais (Dezembro de 1917 a Dezembro de 1918) proporcionou condições para uma reafirmação das propostas autonomistas para a Madeira. A governação do major Sidónio Pais foi um dilema e equívoco: o chefe era republicano e mação, mas o seu apoio estava nos inimigos da República, isto é, entre os monárquicos e os católicos, que entretanto haviam constituído uma agremiação política, o Centro Católico, cuja figura principal na Madeira era o Dr. Juvenal de Araújo (…).

«”O Sr Sidónio Pais tem falado muito, de norte a sul do país e ainda nada logrou dizer que valha a pena ouvir-se.(…). Está a vida cada vez mais cara, para muitos sendo já incomportável?” [A Época, 7 de Abril de 1918] («História da Madeira», coordenada por Alberto Vieira, setembro 2001).

Sidónio Pais era militar com o posto de major, professor de matemática da Universidade de Coimbra, diplomata e político. Foi ministro do Governo de João Chagas. Com a sua revolução queria “arrumar a casa” e tirar o País de uma situação pouco digna, em relação ao mundo civilizado. Com o nome de «República Nova», Sidónio Pais teria a intenção de criar no País uma outra política governativa, capaz de o redimir de tanta balbúrdia partidária.

Segundo João França (DN -Madeira, 10/12/1993) Sidónio Pais foi “vitorioso após três dias de luta armada, falava o Sidónio à Nação, expondo as suas intenções nestes temos: formação de um Governo sério, honesto, competente, capaz de administrar o País com inteligência e honradez num regime de liberdade e tolerância, no qual todas as classes pudessem viver com dignidade; manter relações internacionais e os compromissos com os países aliados, ficando ao lado deles na guerra contra a Alemanha. Eram essas as linhas mestras da sua República Nova. Homem de inteligência brilhante, tinha o Sidónio um conselheiro amigo e também admirador: o Prof. Egas Moniz. Todavia, nem sempre o revolucionário acatava os conselhos do cientista, por questões de desacordo, principalmente acerca dos processos presidenciais. No seu livro «Um Ano de Política», pode ler-se que o Egas Moniz havia aconselhado a prática do semi-presidencialismo, o que seria contrário ao pensamento do Sidónio Pais, pois, a seu ver, apenas o sistema presidencialista estaria certo num País com a então característica político-partidária, tão desavinda (…).

 Uma das cartas de Egas Moniz a Sidónio Pais salienta: “«Soou a hora de procurar competências que auxiliem a obra tão brilhantemente iniciada em 5 de Dezembro. O sr. Presidente terá, para obter esse fim, de caminhar de completo acordo. São dois poderes autónomos, mas que, sobretudo entre nós, carecem de seguir unidos e ligados nas mesmas intenções e propósitos» E mais adiante: «Vivem muitas vezes os Chefes de Estado separados da verdadeira opinião pública, e a lisonja dos que o servem e um pouco a separação das multidões que só observam de grande altura não deixam ver claro» (…)”.

Contra o presidencialismo sidonista estavam os partidos Democrático, liderado por Afonso Costa; Unionista, de Brito Camacho; Evolucionista, de António José de Almeida.

(continua)

sexta-feira, 11 de junho de 2021

 

               Conflitos das Autonomias da Madeira (35)

A «História da Madeira», coordenada por Alberto Vieira, salienta que “na discussão, ocorrida na Câmara dos Deputados em 19 de Abril de 1912, ficou expressa a opção republicana quanto às disposições especiais que regulavam a administração dos distritos insulares: «Trata-se de manter e sancionar um regime que aqueles distritos gozam (…) que produziu já os seus bons resultados na administração distrital». O Visconde da Ribeira Brava considerava em 1913 que o novo regime era a via desejada para a solução dos problemas da Madeira. Com a República chegou a «hora de fazer justiça à nossa terra (…). Durante vários anos a Madeira foi despojada da quase totalidade dos seus rendimentos, enviando milhares de contos, e não recebendo o mais insignificante melhoramento».

Ele como deputado, vogal da Junta Geral e Presidente da Junta Agrícola, criada em 1911, actuou em benefício e promoção da agricultura. A par disso apostou na protecção à floresta, criando-se em 1913 a polícia rural e florestal.  O plano de actividades completa-se com a abertura de estradas, de que se destaca a via entre o Funchal, Machico e São Vicente.

Para Avelino Quirino de Jesus a reivindicação do alargamento da autonomia da Madeira e Açores passa pelos aspectos financeiros e económicos e não pelos morais e políticos. Esta foi a preocupação do movimento autonomista dos anos vinte que insistiu na valorização do papel da Junta Geral, cuja intervenção nos melhoramentos públicos não se fazia por falta de recursos financeiros. Os avanços autonómicos passavam pelas questões financeiras.

A crise económica derivada da primeira guerra (1914-1918), fez com que despertasse o espírito autonómico insular. A frustração face às esperanças federalistas não assumidas pelos republicanos fez com que a solução fosse de novo orientada pelos sectores monárquicos da sociedade insular. A solução para estas dificuldades passará de novo pelo apelo à descentralização como forma de combater os problemas que afligiam a Madeira. (…).

Nos Açores cresceu o movimento separatista, fruto duma simpatia confessa com os Estados Unidos. Este movimento foi entendido por Brito Camacho, líder do Partido Unionista, como forma de pressão usada pelos açorianos quando pretendiam «fazer alguma imposição à politicagem de Lisboa, ou fosse para lhe não mandar desembargadores, ou fosse para lhe subsidiar estradas».

Os madeirenses acompanharam os açorianos na reclamação de mais autonomia, retorquindo às reclamações dos políticos continentais quanto ao separatismo (…) Nas vésperas do Sidonismo, o Visconde do Porto da Cruz (1890-1962) em artigo intitulado o «Regionalismo», publicado no semanário madeirense O Progresso em 1917 faz notar o subtítulo do semanário («órgão de propaganda da Madeira»), incitando os madeirenses a lutar em prol da defesa dos seus interesses. Na sua óptica, de monárquico integralista declarado, o verdadeiro patriota tinha de ser à partida regionalista e o regionalismo e o patriotismo não se coadunavam com as facções partidárias do regime democrático da 1ª República. Propunha por isso uma luta empenhada contra a concorrência económica dos estrangeiros (ingleses) e contra o espírito estrangeiro de alguns portugueses que haviam copiado modelos políticos estranhos à tradição portuguesa da monarquia absoluta, por cujo regresso suspirava”.

A luta pela Monarquia tradicional avaliza as ditaduras de: Pimenta de Castro (1915), Sidónio Pais (1917-1918), ditadura Militar, Estado Novo e simpatia pelo nazismo.

(continua)

sábado, 5 de junho de 2021

 

               Conflitos das Autonomias da Madeira (34)

A instabilidade vivida a nível nacional teria naturalmente reflexos nas constantes mudanças de Governadores Civis, embora sem mudança no modelo administrativo do Distrito. Apenas houve mudança das personalidades que exerciam o cargo de Governador Civil. Foi a lógica política que sempre funcionou. Não seria desta vez que haveria exceção, pois, logo no dia 6, um telegrama indigitava o Dr. Manuel Augusto Martins para substituir o Governador Civil monárquico, José Ribeiro da Cunha. Com o Governador Civil ausente, quem exercia as funções era o Secretário-Geral, o conselheiro António Jardim de Oliveira que entrou em conversações com o comandante militar, coronel Valeriano José da Silva e com o indigitado Governador Civil, facilitando, assim, a mudança de titular. Ao longo de pouco mais de quinze anos de duração da I República, a Madeira teve trinta Governadores Civis, o que corresponde a dois por ano.

O ideal autonomista continuou vivo ao longo dos anos não se limitando às leis publicadas no tempo da monarquia, nem ficaram esmorecidas face ao querer nacional.  A autonomia foi bastante debatida nos dois arquipélagos, debates que teriam como consequência novas formulações legais futuras. Em 1921-1922-1923, o Poder Central foi profusamente contestado quer nos Açores, quer na Madeira, devido à carga fiscal imposta aos distritos, cujos poderes estavam limitados por tais ónus, sendo ainda afetada a sua vida económica e social. O projeto de autonomia para os Açores em 1921 de Francisco d’Atayde, e as opiniões de editorialistas da imprensa madeirense, no ano seguinte, fizeram eco nas críticas cerradas ao Governo Central de então. Convém também ter em conta que o próprio Presidente da Junta Geral do Funchal, Dr. Fernando Tolentino da Costa, em 9 de novembro de 1922 na sessão de boas-vindas ao Presidente da República, António José de Almeida (vindo do Brasil, fez escala no Funchal), declarou-se formalmente o iniciador de um movimento por uma ampla autonomia.

A Junta Geral do Funchal, na sessão de 3 de novembro de 1922 deliberou dar conhecimento do movimento autonomista às Juntas Gerais de Ponta Delgada e Angra do Heroísmo, a fim de conjugarem esforços nesse sentido. O projeto que o Dr. Pestana Reis apresentou na reunião da Junta Geral do Funchal em 16 de dezembro de 1922 revela bem a força viva dos ideais autonomistas presente na opinião pública açoriana e madeirense daquela época. Com a mesma temática, em 5 de janeiro de 1923 realizou-se um grande debate entre açorianos e madeirenses no Terreiro da Luta.

“A decentralização não aliena a qualidade de português, mas dá à região decentralizada foros de se governar por si mesma, sem tutela de governos que nem sempre estão a par das necessidades das diversas regiões” (in Verdade, 19/11/1917).

Em «História da Madeira», coordenada por Alberto Vieira, destaca que “Os republicanos quando assumiram o poder limitaram-se a expressar na Constituição de 1911 (Título VI, artigo 30º) a situação já reconhecida para as ilhas desde 1895. A revista dos estatutos dos distritos autónomos foi remetida para o novo código administrativo, que nunca foi aprovado, regulando-se a execução por lei nº 88, de 7 de Agosto de 1913 e as leis nº 621 de 23 de junho de 1916 e nº 1453 de 26 de Julho de 1923. Na primeira lei sobre o funcionamento dos corpos administrativos não transparece qualquer diferença em relação ao sistema de governo dos distritos continentais”.

(continua)