Madeira – A derrapagem da Autonomia
O figurino constitucional desde 1976 consagrou que os Açores e a Madeira constituem regiões autónomas dotadas de estatutos politico-administrativos próprios. Não foi por mera invenção que os deputados constituintes inscreveram no texto constitucional que o fundamento da autonomia tinha a ver com os “condicionalismos geográficos, económicos, sociais e culturais e nas históricas aspirações autonomistas das populações”.
A autonomia foi uma conquista que criou grandes expetativas na população, uma vez que passava a haver mais poderes regionais, cuja amplitude em nada se comparava aos que existiam na Junta Geral do Distrito Autónomo do Funchal. Mas para infortúnio dos madeirenses, os sociais-democratas, que ganharam todas as eleições regionais, em vez de usarem a Autonomia para consolidarem o desenvolvimento social, económico e cultural com sustentabilidade, aos poucos promoveram a derrapagem do Poder Autonómico, criando um sistema que levou a uma Autonomia dependente e hipotecada.
Foi pela via orçamental, usando e abusando da “autonomia financeira” das receitas e despesas, que a maioria política promoveu e incentivou a derrapagem e a dependência externa da Autonomia. E para esconder o calamitoso estado a que a Autonomia chegou, a maioria absoluta inventou sempre culpados externos.
Um dos fundamentos para a derrapagem da Autonomia é o longo tempo de 36 anos que a mesma maioria absoluta leva no Poder regional. Tempo demais para criar vícios favoráveis à instalação de grupos de interesses. Aliás, o PPD-M de 1975 era o que defendia que o “Governador seria o órgão executivo em que se centralizariam os serviços Distritais, eleito pelo povo, por sufrágio directo e universal, por maioria absoluta, com o mandato de quatro anos, não podendo ser reeleito para não fazer a governação cair numa rotina perniciosa, nem faz cultivar o gosto ou o vício pelo poder”.
Desde 1977, primeiro ano de orçamento autónomo, mas especialmente a partir de 1978, que a gestão financeira regional autónoma colocou em perigo a Autonomia.
Quando, em 11/12/1984, o Governo Regional elaborou um memorando sobre a situação financeira da RAM, concluiu que a Região tinha obtido créditos com aval do Estado, no valor de 22 170 000 contos.
Daí em diante, nunca mais parou a gravidade das finanças regionais, ao ponto de, por três vezes o Presidente do Governo ter-se agachado perante o Governo da República no sentido de pedir auxílio para salvar a Região Autónoma da Madeira da total falência financeira.
Não se pense que os problemas financeiros apenas surgiram em 2011, quando foram descobertas dívidas que não constavam nos registos oficiais (a chamada dívida escondida). Não senhor! A reincidência por dívidas excessivas tem pelo menos 25 anos.
* A primeira vez resultou no «Programa de Reequilíbrio Financeiro da Região Autónoma da Madeira», de 26/02/1986.
* Na segunda, surgiu o «Programa de Recuperação Financeira da Região Autónoma da Madeira», de 22/09/1989.
* A terceira foi no ano de 1998, ano da graça para a dívida direta da Região, quando António Guterres perdoou 110 milhões de contos à Madeira, correspondendo a 75 por cento da dívida direta total.
Mas apesar daquele perdão, os problemas da dívida da Madeira não terminaram. Com calotes sobre calotes a economia regional não conseguiu gerar receitas para pagar as dívidas que se foram acumulando, até chegarmos à quarta intervenção do Estado no rombo financeiro da Região, consubstanciada no «Programa de Ajustamento Económico e Financeiro da Região Autónoma da Madeira», de 27/01/2012, decorrente da Carta de Intenções, de 27/12/2011.
Depois de tanto descalabro financeiro, que colocou a Autonomia em estado precário e sem poder real de a gerir, o maior problema de hoje é o facto de ainda permanecer à frente do Poder Regional a mesma força política que criou os problemas que levaram à derrapagem da Autonomia.
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