Conflitos
das Autonomias da Madeira (49)
No dizer do Dr. Juvenal de Araújo, um conflito terminado com a vitória de
um interesse sobre o outro, quando a verdade num caso especial da expropriação
o que há, o que deve haver é a conciliação de direitos. “Esse equilíbrio é que
o Estado tem de saber estabelece-lo, por meio duma legislação criteriosa e
justa, que afaste e evite precisamente esse conflito que é falsamente
pressuposto pelo argumento produzido. E assim deve ser, porque a função do
Estado é, essencialmente, unificadora ou moderadora, e para o exercício desta
função o Estado não tem apenas o dever de assegurar as condições de existência
e desenvolvimento da sociedade, mas também o bem estar moral e material dos
indivíduos que a compõem e procurar o equilíbrio de todas as suas manifestações de actividade
e de riqueza.
E, assim, o Estado nunca póde aparecer diante de nós e, no caso sujeito,
diante da classe dos proprietários, como uma entidade discrecionaria, impondo o
arbítrio. O Estado, como sujeito de direitos, está preso pela força da lei,
está obrigado pelas regras jurídicas, e nenhuma regra jurídica deve perdurar
quando não esteja em estricta harmonia com as condições sociais do momento e
quando não seja imposta pelo espírito de justiça. Que o interesse pessoal de
cada indivíduo deve ceder ao interesse comum – é incontestável, mas temos de
usar de todas as cautelas na aplicação deste principio. Há uma méta, um limite
que o interesse comum não póde transpor: é o ponto em que termina a defesa do
interesse comum, para começar o abuso e a delapidação.
Ataca-se ainda, Sr. Presidente, o parecer em discussão, argumentando-se que
o Estado tem o direito de expropriação, e não é legítimo que se lhe levante
dificuldades para o exercício dêsse direito incontestável, fazendo-se com que
êle vá indemnizar o proprietário duma propriedade expropriada com um valor
superior àquêle que consta da matriz. Ora, não é bem assim. A premissa está mal
posta. O direito fundamental, essencial, que aqui ha a atender, é inteiramente
outro: é o direito de propriedade, que é o mais extenso de todos os direitos
reais.
A expropriação não é mais do que uma delimitação ao exercício pleno e
absoluto desse direito e, por isso, tem de sêr considerada e interpretada nos
seus precisos termos, e nunca em termos tão amplos que se confunda com o
confisco. E é por isso que o que distingue o instituto jurídico da expropriação
não é apenas o ser uma privação forçada da propriedade: ela é, de facto, uma
privação forçada da propriedade, mas mediante justa indemnização. – Esta é que constitui, completamente, a
característica do instituto da expropriação.
Percorram-se todas as legislações modernas, e ver-se-ha que é êste o principio consignado em todas elas. Tenho
ouvido, muitas vezes, dentro e fóra desta Camara, apelar-se para a legislação
francesa, principalmente para aquela que foi promulgada ao influxo dos ideais
novos semeados pela Revolução. Pois eu aceito, transitoriamente, para efeitos
de argumentação, esse ponto de vista, e coloco-me no campo para que me
arrastam, analisando o que se passa em França em materia de legislação sobre
expropriações. E o que se verifica então? Que a lei de 1807, que durante certo
tempo foi a que vigorou em matéria de expropriações, não resistiu aos golpes da
campanha terrivel que lhe foi movida, precisamente por colocar o interesse dos
cidadãos em absoluta dependência do poder administrativo. E a lei, que hoje
vigora, é a de 3 de maio de 1841 (…)”.
(continua)
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