Conflitos
da Autonomia – Água Revolta Povo da Calheta
Eram dez
horas da manhã do dia 20 de junho de 1953 quando repicou o sino da capela de S.
Pedro, no Lombo do Atouguia (Calheta). Não se tratava de sinal de qualquer
cerimónia religiosa, mas para Revolta
Popular contra a usurpação de água por parte da Comissão Administrativa
dos Aproveitamentos Hidráulicos da Madeira (CAAHM).
A Revolta
desenrolou-se junto da Ribeira do Luís, onde passava a nova levada que conduzia
água da Central Hidroelétrica para irrigar a parte leste do concelho da
Calheta. A água da revolta era a que corria no leito da Ribeira, mas que tinha
sido desviada pelos serviços públicos para a nova levada que fazia parte do
primeiro ciclo do Plano de Fomento da Madeira (Plano Hidroagrícola).
Passados sessenta
e nove anos, parece irrealista admitir que, em plena pujança do regime salazarista,
algumas dezenas de pacíficas pessoas se tivessem revoltado contra o Poder
instituído, cuja rebelião causou a prisão de meia dúzia de mulheres, de entre
as quais a que tocou o sino.
Se as
revoltas populares parecem desenrolar-se sempre nas cidades, o certo é que o
povo, ao sentir-se lesado, não escolhe lugar nem regime político para agir em
defesa dos seus direitos.
Primeiro
no calaboiço e depois, durante cerca de um mês, a cadeia dos Viveiros
encarcerou aquelas mulheres que mais ativamente destruíram a levada que desviou
a água da ribeira para a outra levada do grande empreendimento da época: uma
central hidroelétrica e uma grandiosa conduta. Mas não havia plano público, por
mais importante que fosse, que tivesse mais interesse do que a sua água. E o
povo acabou por perder a “batalha”, cujas armas foram as enxadas com que cavavam
a terra! Mas, apesar disso, aquele facto ficou na história daquele sítio da
Calheta, e que merece relembrar sempre, até pelo local da revolta era tão
natural como naturais eram as necessidades de água para a agricultura.
O regime
hidroagrícola da Madeira nunca foi pacífico. A água, aparentemente abundante,
sempre criou conflitos pelo direito de propriedade e utilização. Nascentes
várias brotavam água que motivou a construção de levadas que passaram por
locais inacreditáveis. Foi uma obra útil e necessária para a realidade agrícola
de então e para o consumo domiciliário, neste caso retirada dos fontenários
públicos ou diretamente das nascentes. Ainda hoje se discute, investiga,
projeta e constrói obras com vista à captação e condução de tão precioso
líquido. E cada vez mais ela é escassa! A luta pela água de rega é cada vez
mais acentuada.
A questão
das águas foi de tal ordem complexa que já D. João II tomou medidas de caráter
legislativo fixando princípios de direito que serviram de orientação para as
entidades públicas que vieram a ser as Levadas. Pelos séculos adiante, nunca
mais pararam as medidas reguladoras desta matéria, mesmo reconhecendo direitos
adquiridos em épocas passadas.
A Revolta
tem a sua mais direta relação na criação, em 1943, da CAAHM que ficou com a
competência de promover e orientar a execução dos novos empreendimentos
hidroagrícolas e hidroelétricos da Madeira.
Legislação de 1947 e de 1952 completou o regime jurídico daquele plano
que incluía a construção das centrais hidroelétricas e levadas de maior dimensão
e capacidade, cuja despesa seria suportada metade pelo Estado e metade pela
Junta Geral.
A levada
em questão ficou incluída na primeira fase do grande projeto e foi classificada
“Levada da Calheta-Ponta do Pargo”, irrigando os terrenos a partir da Madalena
do Mar até a Ponta do Pargo, numa extensão de
Sem comentários:
Enviar um comentário