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sexta-feira, 26 de abril de 2013

Atropelos à Autonomia

O novo modelo de Autonomia consagrado na Constituição de 1976 trouxe grandes expetativas para o progresso social, económico, cultural, político e até mesmo religioso. Apesar do poder exercido mais próximo das populações, as rosas do novo Poder foram emolduradas com muitas camadas de espinhos que arranharam a conduta dos novos inquilinos da administração regional autónoma. Foi de tal modo exercido que não foi capaz de acabar com as graves entorses bem patentes na sociedade regional. E teve comportamentos adequados que serviram de pretexto a práticas graves de atropelos à Autonomia, por parte de instituições e órgãos do Estado centralista.

Exemplos não faltam no rol de práticas que ferem a Autonomia insular. A mais recente de que tive conhecimento partiu de uma entidade que nem sequer tem competência legislativa no âmbito nacional. Trata-se da Caixa Geral de Aposentações (CGA), que tem competência de aplicar a lei no que refere às quotizações recebidas e pagamento das aposentações e subvenções.    
Sem fundamento legal, a CGA está a enviar ofícios a ex-deputados da Assembleia Legislativa da Madeira, que exerceram funções antes e após a data da entrada em vigor da Lei nº 52-A/2005, de 10 de Outubro, e que recebem subvenção mensal vitalícia ao abrigo nas normas constantes do artigo 75, nºs 19 e 20 (direitos adquiridos), do Estatuto Político-Administrativo da Região Autónoma da Madeira (EPARAM), cuja iniciativa de revisão cabe exclusivamente à Assembleia Regional.
O ofício destina-se a cumprir o direito de audição do interessado, tendo em conta a hipótese de vir a ser reduzido o valor da Subvenção, caso deixe de contar o tempo posterior ao da enrtrada em vigor daquela lei que foi aplicada apenas aos deputados da Assembleia da República.
O absurdo ofício da CGA está no facto de basear a diligente iniciativa numa opinião da Secção Regional do Tribunal de Contas, bem como estar a aguardar parecer do Conselho Consultivo da Procuradoria-Geral da República, solicitado pelo Secretário de Estado do Orçamento. Ou seja, estamos perante a subversão absoluta das competências da CGA que não fundamenta a sua iniciativa em qualquer lei, mas apenas em opiniões e num futuro parecer.

Trata-se de uma matéria social e politicamente polémica e calorosamente discutida, mas o que está aqui em causa é que a Lei nº 52-A/2005, de 10 de Outubro, não é aplicável nas Regiões Autónomas. Nem aos atuais Deputados, nem aos que auferem subvenção mensal vitalícia, tendo exercido a função de deputado em tempo posterior à entrada em vigor daquela lei. Tanto mais que o artº 10º da mesma lei, na sua aplicação, não considera titulares de cargos políticos os deputados às assembleias regionais, onde se inclui, obviamente, os que auferem Subvenção Mensal Vitalícia.
Além disso, o artigo 231º, nº 7, da Constituição da República estabelece que “O estatuto dos titulares dos órgãos de governo próprio das regiões autónomas é definido nos respectivos estatutos político-administrativos”, e nas normas revogatórias, referidas no artº 6º daquela lei, não consta, nem podia constar, a revogação da norma constante do citado nº 19 do artigo 75º do Estatuto Político-Administrativo, razão pela qual esta norma mantém-se plenamente em vigor.

Do que decorre do referido direito de iniciativa de proceder a alterações do EPARAM, os poderes constitucionais da Região Autónoma da Madeira não podem ser violados por outros órgãos que legislam, nem muito menos por aqueles que emitem opiniões e pareceres, por muito respeito que se possa ter por eles.
Aliás, a jurisprudência do Tribunal Constitucional tem refletido o entendimento de que nenhum órgão de soberania pode legislar em matéria reservada às assembleias legislativas regionais. O exemplo que reflete uma analogia perfeita à questão das subvenções, foi quando a Assembleia da República tentou legislar em matéria de incompatibilidades dos titulares dos órgãos de governo próprio das regiões autónomas. O Acórdão nº 382/2007 do Tribunal Constitucional é bastante elucidativo. Neste Acórdão o Tribunal Constitucional pronunciou-se “pela inconstitucionalidade, por violação das disposições conjugadas dos artigos 231º, nº 7, e 226º, nºs 1 e 4, da Constituição da República Portuguesa, da norma constante do artigo 1º do Decreto nº 121/X, de 17 de Maio de 2007, da Assembleia da República, que «altera o regime das incompatibilidades e impedimentos dos titulares de cargos políticos e altos cargos públicos»” por aquele decreto da Assembleia da República incluir “os deputados das Assembleias Legislativas das Regiões Autónomas (…)”.



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