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terça-feira, 5 de novembro de 2013

Deputados com voto controlado

A pena de suspensão, por cinco meses, que o Conselho Nacional de Jurisdição do CDS-PP aplicou a Rui Barreto, em funções de deputado na Assembleia da República, levanda algumas questões jurídico constitucionais de legalidade de tal sanção.

O castido aplicado ao deputado deveu-se ao facto deste ter votado contra o Orçamento do Estado para 2013, tendo desrespeitado o regulamento do seu Grupo Parlamentar, que determina a obrigatoriedade de todos os deputados terem o mesmo sentido de voto que o Grupo determinar em cada momento – no caso do Orçamento do Estado (OE), o voto devia ser a favor, dada uma invocada relevância política que tem o OE.

É precisamente essa obrigação de um deputado votar num determinado sentido, por imposição do grupo parlamentar, que no meu entender a norma concreta do regulamento viola o artigo 155º, no 1 (primeira parte) da Constituição da República, ao estabelecer que “Os Deputados exercem livremente o seu mandato (…)”.

E por muito que se invente subterfúgios para impor o voto num determinado sentido, certo é que o mandato do deputado exercido livremente não abrange apenas a presença física, mas está também inerente à sua consciência de escolher o sentido de voto que entenda, a todo o momento e em todas as matérias em votação. A não ser assim, é o grupo parlamentar que se sobrepõe ao interesse do povo que o deputado representa e enteda ser a melhor opção.

No âmbito nas imunidades dos deputados, o artigo 157º, nº 1, da Constituição estabelece que “Os Deputados não respondem civil, criminal e disciplinarmente pelos votos e opiniões que emitirem no exercício das suas funções”.

No meu entender, ao abrigo desta norma constitucional o deputado Rui Barreto não podia ser alvo de um processo disciplinar movido pelo Partido, ou por qualquer entidade, caso contrário um qualquer deputado pode ser sancionado por iniciativa arbitrária do grupo parlamentar, mesmo que este seja estatutariamente um órgão do Partido.

Também a lei geral, que regula o regime dos partidos políticos, estabelece (artigo 24º) que “Os cidadãos eleitos em listas de partidos políticos exercem livremente o seu mandato, nas condições definidas no estatuto dos titulares e no regime de funcionamento e de exercício de competências do respectivo órgãos electivo”.

Ora, o Estatuto dos Deputados (artigo 10º) não só repete a norma do artigo 157º, nº 1, da Constituição, acrescentando “e por causa delas”, mas também estabelece que devem observar (artigo 14º, nº1, al. f) o Regimento da Assembleia da República.

E o regimento ao permitir que uma das formas de votação seja por “levantados e sentados”, também estabelece no artigo 94º, nº 3, que “Nas votações por levantados e sentados, a Mesa apura os resultados de acordo com a representatividade dos grupos parlamentares, especificando o número de votos individualmente expressos em sentido distinto da respectiva bancada e a sua influência no resultado, quando a haja”.

Em parte alguma da Constituição da República, do Estatuto dos Deputados e do Regimento está estabelecido que um deputado deve votar de acordo com o regulamento do grupo parlamentar, apesar de o Regimento estabelecer que “Os deputados eleitos por cada partido ou coligação de partidos podem constituir-se em grupo parlamentar” (artigo 6º, nº 1) e que um dos direitos de cada grupo parlamentar seja o de “Eleger a sua direcção e determinar a sua organização e regulamento internos” (artigo 9º, al. a) ).

Na qualidade de filiado no CDS-PP o deputado Rui Barreto aderiu à Declaração de Princípios e ao Programa do Partido Popular e tem o dever de respeitar os “Estatutos e os Regulamentos aprovados pelos órgãos competentes, bem como acatar as directrizes dos órgãos do Partido” (artº 6º dos Estatutos). Mas tem o direito de “manter a sua liberdade de opinião desde que, ao exercer esse direito na qualidade de membro do Partido, se conforme com o programa do Partido Popular e com as directrizes dos respectivos órgãos” (artº 7º). Mas a questão do sentido de voto como deputado não pode caber no respeito das diretrizes de qualquer órgão.

O artigo 31º, nº 2, da Lei dos Partidos Políticos determina que “Da decisão do órgão de jurisdição pode o filiado lesado e qualquer outro órgão do partido recorrer judicialmente, nos termos da lei de organização, funcionamento e processo do Tribunal Constitucional”.
E como a interpretação de normas de direito não é uma ciência exata, gostaria de saber o resultado de um hipotético recurso. Aliás, se porventura o Rui Barreto não fosse membro do CDS-PP, mas integrasse o grupo parlamentar e tivesse votado contra o Orçamento do Estado, qual seria a sanção a aplicar?







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