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segunda-feira, 29 de agosto de 2016

Da confiança à crise dos Bancos (30)

A Resolução de 20 de dezembro de 2015 que assassinou o Banif – Banco Internacional do Funchal, SA, pondo em causa muitos clientes detentores de obrigações e acionistas que acreditaram nas entidades que aprovaram a emissão daqueles títulos, contém anormalidades e contradições que são temporal e quantitativamente difíceis de explicar:
- No dia 19 de dezembro, o Banco e Portugal decidiu iniciar o processo de Resolução, convidando as instituições que mostraram interesse na aquisição da participação acionista do Estado a apresentar propostas de aquisição: as “duas instituições de maior dimensão e capacidade financeira: o Banco Popular Español, SA e o Banco Santander Totta, S.A”. Só o Santander apresentou “uma proposta vinculativa e, com base na mesma, o Banco de Portugal iniciou negociações com este potencial adquirente, com vista à obtenção de um acordo que permitisse concluir a aplicação da medida de resolução com a alienação da astividade do BANIF”.
- Se o que estava em causa era vender a participação do Estado no Banif, (70.000.000.000 ações (60,533%) e direitos de voto de 49,374%), a conclusão foi outra totalmente diferente. O valor da venda de ativos e passivos foi por 150 milhões de euros. No ponto 4 dos considerandos da Resolução está expresso que “A seleção dos direitos e obrigações do BANIF a alienar teve em atenção os princípios orientadores da aplicação de medidas de resolução previstos no nº 1 do artigo 145º-D do RGICSF (Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras), as finalidades das medidas de resolução consagradas no nº 1 do artigo 145º-C do RGICSF, bem como a continuidade da prestação dos serviços essenciais para a economia, tendo resultado das negocições com o Banco Santander Totta, S.A., e de interações com o Ministério das Finanças, enquanto garante último da estabilidade financeira, nos termos do artigo 91º do RGICSF”.

Penosa é a legislação europeia e nacional que regula o sistema bancário, ao ponto de, desde 1992 até abril de 2016, ter havido 41 alterações ao RGICSF. Também aconteceu com os poderes dados ao Banco de Portugal que, sendo entidade Reguladora, tem poderes para, administrativamente, matar um Banco, vendendo-o às fatias e criar uma sociedade anónima para onde transfere os, doentemente, chamados «produtos tóxicos». Aconteceu com o BES e também verificou-se com o Banif.
A Resolução que decretou o fim do Banif criou a Sociedade Navigest, S.A. e respetivos estatutos, para a qual seriam transferidos “os direitos e obrigações correspondentes a ativos do BANIF, como sejam: ativos imobiliários que sejam propriedade do BANIF, com exceção daqueles que estejam a ser utilizados ou ocupados pelo BANIF no exercício da sua atividade”; ações ou unidades de participação emitidas pelas empresas do Grupo Banif; quaisquer empréstimos a empresas ou entidades do Grupo; outros minuciosamente especificados em anexos à Resolução.

Uma entidade Reguladora que tem poderes para matar um Banco e criar um «veículo» como é a Navigest, S.A., é estarmos à margem das mais elementares lógicas da criação de sociedades financeiras. Apesar da Navigest se reger pelo Código das Sociedades Comerciais, não passa de ser uma anomalia jurídica. A Navigest tem um capital de 50 mil euros, “detidos na sua totalidade pelo Fundo de Resolução”, capital incomparável ao que é exigido para um Banco.  
Aconselho a leitura da Resolução do Banif por quem estiver interessado em saber mais pormenores da monstruosidade que assassinou aquele Banco.
Da minha parte, darei continuidade à resumida história da Banca em Portugal, acabando, por agora, a do Banif.
(continua)

segunda-feira, 22 de agosto de 2016

Da confiança à crise dos Bancos (29)

O dia 20 de dezembro de 2015 foi o DOMINGO MAIS NEGRO da história do Banif – Banco Internacional do Funchal, SA, desde a sua criação em 15 de janeiro de 1988, com a sucessiva institucionalização do Grupo Banif. Foi naquele fatídigo dia que, em reunião extraordinária do Conselho de Administração do Banco de Portugal, pelas 23H30, foi deliberado aprovar a morte daquela instituição. Foi um verdadeiro assassinato de uma instituição financeira, servindo-se de um nefasto ato administrativo designado «MEDIDA DE RESOLUÇÃO».
Os assassinos do BANIF foram Carlos da Silva Costa (Governador), Pedro Duarte Neves e José Ramalho (Vice-Governadores), João Amaral Tomaz, Antonio Varela e Helder Rosalino (Administradores).
Mas, no início da reunião, o “Administrador António Varela apresentou um motivo de impedimento, que o Governador considerou justificado nos termos da lei, em virtude de ser depositante do BANIF e detentor de valores mobiliários por este emitidos pelo que não participou na presente deliberação, tendo, no entanto, declarado antes de se ausentar a sua total solidariedade com qualquer decisão que o Conselho viesse a tomar”.
O facto é que o motivo de impedimento de António Varela é um falso argumento, uma vez que já sabia a decisão a tomar, tanto mais que o primeiro considerando da Resolução, à qual promete solidariedade, refere que “O Banco de Portugal, por deliberação do seu Conselho de Administração de 19 de dezembro de 2015 (18h00) declarou que o BANIF – Banco Internacional do Funchal, S.A. se encontrava «em risco ou em situação de insolvência» («failling or likely to fail») e decidiu iniciar o processo de resolução da instituição na modalidade de alienação parcial ou total da sua atividade, convidando as instituições que mostraram interesse na aquisição da participação acionista do Estado Português no BANIF a apresentar propostas de aquisição num contexto de resolução, tendo em conta que as mesmas cumpriam os requesitos da Carta de Compromissos do Estado Português quanto ao perfil da instituição adquirente e que constituíam as duas instituições de maior dimensão e capacidade financeira, a saber: o Banco Popular Español, SA, e o Banco Santander Totta, S.A”.

A situação do Banif «em risco ou em situação de insolvência» foi uma invenção do Banco de Portugal, apenas pelo facto de não ter sido vendida a participação do Estado no capital social. E não é credível que apenas em pouco mais de 24 horas fosse possível iniciar e concluir o texto da Resolução, dos estatutos da Navigest, dos direitos e obrigações dos ativos do Banif e da parte vendida ao Santander Totta. O Banco de Portugal atuou com uma impunidade atroz, mesmo invocando o artigo 146º, nº 1 do Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras, argumentando com desplante e sinismo que havia “necessidade premente das medidas agora tomadas para salvaguardar a continuidade da prestação dos serviços financeiros essenciais assegurados pelo BANIF -Banco Internacional do Funchal, S.A., bem como para preservar a estabilidade do sistema financeiro português, as presentes deliberações são consideradas urgentes nos termos e para os efeitos do disposto na alínea a) do nº 1 do artigo 124º do Código do Procedimento Administrativo, não havendo lugar a audiência prévia dos interessados”.

Na ignóbil decisão de fazer desaparecer o Banif, entrou a Comissão Europeia que aceitou a proposta do Banco de Portugal, conforme refere o ponto 14 dos considerandos da Resolução: “A aplicação das medidas de resolução atrás descritas constitui uma solução que a Comissão Europeia considerou compatível com o mercado interno”.

(continua)

terça-feira, 16 de agosto de 2016

Da confiança à crise dos Bancos (28)

Quando no dia 15 de dezembro o Banco de Portugal afirmou que o plano de reestruturação do Banif estava a ser analisado pela Comissão Europeia e que, em paralelo, estava a “decorrer um processo de venda internacional da instituição financeira”, esta última afirmação tem tanto de enigmática como reveladora de má fé para esconder a resolução que estava a ser negociada clandestinamente com a Comissão Europeia. Se a entidade reguladora Banco de Portugal fosse uma entidade de bem e estivesse com seriedade a procurar uma saída para bem do Banif e dos seus acionistas e clientes não tinha necessidade de falar por parábolas e vir a reunir o seu Conselho de Administração no domingo, 20 de dezembro de 2015, pelas 23,30 horas, para aprovar a Resolução do Banif. Reparem bem, o trapalhão Banco de Portugal precisou de reunir num domingo, pelas 23,30 horas, para criar mais uma trapalhada no sistema financeiro português, e lançar mais achas para a descredibilização da Banca? Só próprio de anormais!

Passada a corrida dos clientes para levantar o dinheiro, na sequência da notícia da TVI, nos dias seguintes tudo parecia voltar à normalidade no Banif. Quem acompanhava essa anunciada normalidade não imaginava o que estava a ser congeminado nos bastidores dos sabotadores financeiros: o Regulador português (Banco de Portugal) e a Comissão Europeia.

Entretanto, o Administrador do Banif, Jorge Tomé, contava com apoios para apresentar queixa contra a TVI, bem como anunciava a existência de acalmia na instituição, afirmando: “A minha mensagem é uma mensgem de serenidade e tranquilidade para todos os clientes do banco, não há nenhuma comparação entre o Banif e o BES”. No dia 16, também afirmou à SIC apelando aos investidores que estejam esteressados no Banif que “façam uma proposta o mais rápido possível”. E que “o Banco não foi vendido antes porque o anterior governo não quis misturar a venda do Novo Banco com a da instituição criada por Horácio Roque”.

Os dois Governos, nacional e regional, manifestaram satisfação pelo facto do processo do Banif decorrer dentro da normalidade e na garantia dos depósitos, qualquer que fosse o montante.
 Mas no dia 17 de dezembro a CMVM decidiu suspender a negociação em bolsa das ações do Banif, com o fundamento de “aguardar pela prestação de informação relevante relativa ao processo de venda voluntária do mesmo”. Quando foram suspensas, as ações estavam a valer 0,2 cêntimos. O certo é que a instabilidade das ações do Banif em bolsa agravou-se desde a notícia da TVI, tendo provocado a fúria da avenda das ações a preços cada vez mais degradados.

No dia 18, o Banif anunciou que tinha feito um acordo para a venda da sua participação de 78,46% do capital social do Banif Bank, em Malta, por 18,4 milhões de euros. A concretização daquela venda estava ainda sujeita à autorização do Banco Central Europeu, da Direção Geral de Concorrência da Comissão Europeia, da Direção Geral de Concorrência de Malta e da Autoridade de Serviços Financeiros de Malta. “Esta transacção está alinhada com o plano estratégico do Banif e é espectável que tenha um impacto positivo estimado no rácio de solvabilidade consolidado do Banif em 24 pontos base e 25 pontos base, em base «Phased-in» (transição) e «fully implemented» (com medidas completamente executadas).
O Banif também informou que recebeu seis propostas de aquisição da participação detida pelo Estado, apesar de a Direção Geral de Concorrência já antes ter posto em dúvida que o Banif possa devolver o dinheiro público.


(continua)

segunda-feira, 8 de agosto de 2016


Da confiança à crise dos Bancos (27)

Não obstante o anunciado lucro de 6,2 milhões de euros nos primeiros 9 meses de 2015, à medida que o tempo decorria acumulavam-se as incertezas para salvar o Banif de uma derrocada, tal como havia acontecido ao Banco Espírito Santo (BES). E para adensar o mau presságio, as ações do Banif, que em 28 de outubro de 2015 atingiram 0,002 euros por ação, baixaram para 0,0009 euros no dia 10 de dezembro, subindo para 0,0014 no dia seguinte.
Quando no dia 13 de dezembro a TVI anunciou que estava tudo preparado para fechar o Banif – Banco Internacional do Funchal SA, separando os “ativos bons” dos “ativos tóxicos” - o que veio a ser confirmado no dia 20 pela Resolução aprovada pelo Banco de Portugal – a corrida dos clientes aos seus depósitos criou uma situação incontornável.

Soube-se naquela altura que a Comissão Europeia tinha enviado uma carta, em junho de 2014, ao Governo Português, a fazer exigências quanto ao Banif. Este iniciou reestruturações quanto ao fecho de balcões, despedimentos de trabalhadores e à reformulação das estruturas do Banco e do Grupo. Mas o que não conseguiu foi encontrar quem comprasse as ações detidas pelo Estado.
 Tudo leva a crer que o fim do Banif estava a ser congeminado pelas entidades da área financeira nacional e europeia, nomeadamente o Banco de Portugal e Comissão Europeia, através da sua Direção Geral da Concorrência. O motivo da decisão de acabar com o Banif baseou-se no facto de não terem sido encontrados investidores para comprarem as ações detidas pelo Estado (70.000.000.000 ações (60,533%), o que revela estarmos perante decisões que refletem uma ação de guerrilha financeira que, a somar a tantas outras decisões europeias, no âmbito das instituições financeiras, constituem verdadeiros atos criminosos sem pudor.

Na tentativa de tranquilizar os clientes, no dia 14 de dezembro a administração do Banif desmentiu a notícia da TVI e comunicou à CMVM que “Em linha de conta com a comunicação que efetuou ao mercado em 11 de Dezembro, o Conselho de Administração reafirma que se encontra actualmente em curso, em articulação com as autoridades responsáveis, um processo aberto e competitivo de venda da posição do Estado português no Banif, no qual se encontram envolvidos diversos investidores internacionais, pelo que qualquer cenário de resolução ou imposição de uma medida administrativa não tem qualquer sentido ou fundamento”.
Naquele dia 14, o Primeiro Ministro, António Costa, parece desconhecer que o Banco de Portugal retalharia o Banif usando uma resolução, uma vez que tentou “dissipar qualquer dúvida sobre esta notícia especulativa (…) o processo de reestruturação do Banif em Bruxelas e a nível nacional está a decorrer nos termos normais”. Por seu lado, o presidente do Governo Regional, Miguel Albuquerque, destacou que “o objetivo do Governo é a alienação do capital do Banif e salvaguardar os depositantes, os acionistas e a posição estratégica do Banif junto da diáspora” (DN e JM, 15/12/2015). 
No dia 15, o Banco de Portugal afirmou que “em articulação com o Ministério das Finanças está a acompanhar a situação do Banif, garantindo, como é da sua competência, a estabilidade do sistema financeiro, bem como a segurança dos depósitos, tal como foi revelado pelas autoridades nacionais, europeias e pelo Conselho de Administração do Banif, o plano de reestruturação do banco está a ser analisado pela Comissão Europeia e, em paralelo, está a decorrer um processo de venda internacional da instituição financeira conduzido pelo Conselho de Administração”. O Banco de Portugal atuava enquanto autoridade integrada no Mecanismo Único de Supervisão Europeu.

(continua)

segunda-feira, 1 de agosto de 2016

Da confiança à crise dos Bancos (26)

Quando a 26 de agosto de 2015 a Assembleia Geral do Banif – Banco Internacional do Funchal, SA, eliminou o Conselho Estratégico - órgão consultivo - e procedeu à reeleição dos membros dos órgãos sociais para os três anos seguintes, até 2017, os acionistas não imaginariam que, quatro meses depois, haveria um ato necrológico por parte do Banco de Portugal que desfez e retalhou uma instituição que, por ironia do destino, em 1988 tinha sido criada para evitar a falência da Caixa Económica do Funchal.
O Conselho de Administração continuou a ser liderado por Luís Amado, como presidente, e Jorge Tomé, como vice-presidente e presidente da Comissão Executiva. Algumas mudanças verificaram-se nos administradores com a entrada de Fernando de Almeida, Carlos Firme, Jorge Nunes e Nuno Martins. Estes últimos três integraram a Comissão Executiva, juntamente com João Sousa. Mas continuaram a fazer parte do Conselho de Administração Issuf Ahmad e Miguel Barbosa, ambos em representação do Estado Português, detentor de 70.000.000.000 ações (60,533%) e direitos de voto de 49,374%.
Além disso, Elsa Ramalho e Teresa Duarte integraram a Comissão de Auditoria, em substituição de António da Silva e Tomás Vasconcelos.
Também foi aprovada a Comissão de Remunerações, constituída por Miguel de Sousa, como presidente, e Filipe Marques e Miguel Barbosa.
Para a Mesa da Assembleia Geral foram eleitos Guilherme Silva e José Prada, que sucederam nos cargos a Miguel de Sousa e Bruno Jesus.
Após a reunião, Jorge Tomé afirmou “querer acelerar a reestruturação do banco”, pretendendo que “até o final deste ano esse plano seja aprovado junto da Direção-Geral da Concorrência da Comissão Europeia” e “encontrar um acionista de referência para o Banif, de forma a substituir o Estado, existindo contactos há meses com interessados na compra dessa posição e que esse trabalho vai ter continuidade e mesmo acelerar”.

À medida que o ano 2015 avançava, os problemas do Banif manifestavam-se essencialmnete em três frentes:
- Dificuldade continuada em encontrar acionistas para adquirirem as ações detidas pelo Estado;
- Entrave permanente da Direção-Geral da Concorrência da Comissão Europeia (DGC) em aprovar um plano de reestruturação;
- Degradação do valor das ações cotadas em Bolsa.
Sem nunca ser menisfestado publicamente, mas com um cinismo patente das anacrónicas e nefastas instituições europeias, o que estas exigiam era que as ações do Estado Português no Banif fossem vendidas com a máxima urgência, apesar de não terem existido investidores para elas, com receio dos impasses permanentes. Daí parecer óbvio, mas absurdo, nunca ter sido aprovado um plano de reestruturação por aquela DGC.
A degradação do valor das ações do Banif cotadas em Bolsa é outra consequência da não concretização dos dois problemas anteriores. O tempo passava e, em 28 de outubro, as ações do Banif atingiram o mínimo de sempre, liderando as quedas de entre as 18 cotadas, chegando por ação a 0,002 euros. 

Contrariando os atrasos na tomada de decições para salvar o Banif e os problemas daí resultantes, em 12 de novembro foi anunciado lucro de 6,2 milhões de euros nos primeiros 9 meses. Este lucro foi resultado de vários fatores, incluindo e encerramento de 43 balcões desde dezembro de 2014 e saídas de 694 trabalhadores, redução de amortizações em 29% e de previsões e imparidades em 54%.


(continua)