Conflitos
das Autonomias da Madeira (59)
Dada a questão vinícola da Madeira, o Dr. Juvenal de Araújo continua a
referir que “não há facto algum que nos leve a concluir que esta importação é
requerida pelas necessidades normais do consumo. Não há escassez de vinho
regional, não há escassez de aguardente, não houve tão pouco um tal acréscimo
no numero de consumidores de vinho de pasto que pudesse ter operado, por si,
êste facto verdadeiramente estupendo: que, sendo a importação nos últimos três
anos de 249 cascos anuais em média,
possa ter aumentado legitimamente, no corrente ano, em nove vezes mais.
É voz corrente que a maior parte do vinho importado se destina à preparação
de falso vinho da Madeira, andando igualmente de bôca em bôca os processos por
que se opéra a sua transformação. Reconheço que o vinho de pasto do continente,
como vinho especial de mesa, não tem competidor em nenhuma espécie de vinho
produzido na Madeira; reconheço que tem os seus consumidores especiais, que o
não dispensam. Nem o desejo da Madeira é o de furtar-se por qualquer modo a
constituir um mercado de colocação para vinhos de Portugal. Mas o que a Madeira
tem o direito de exigir é que se rodeie o vinho importado do continente da mais
rigorosa fiscalização, dêsde que êle é submetido a despacho alfandegário até ao
momento em que entra no consumo, de modo a garantir que êle realmente é
destinado à venda avulsa e nunca à sua transformação em vinho generoso da Madeira.
Mas, ultimamente, descobriu-se mais um facto profundamente revoltante: foi
a importação de vinho licoroso do continente, destinado a ir apenas à ilha
receber o nome e o rótulo de Madeira, com que depois seria exportado. É certo que o Regulamento de 8 de Novembro de
1913, pelo seu artigo 4º, apenas permite ali a importação de vinhos generosos
do Porto, Carcavelos e Moscatel de Setubal e dos demais vinhos generosos
nacionais, quando engarrafados e destinados ao consumo local. Entretanto,
inventou-se facilmente o meio de iludir esta disposição legar. E sabem v. exªs
como? Importando o vinho em cascos com o aspecto dos que servem para o embarque
de vinho comum do continente, e submetendo-o depois a despacho como se se
tratasse realmente de vinho de pasto!
Valeu, nêste caso, a fiscalisação da alfândega, que fez a apreensão, mas o
acto aí ficou, eloquentemente, a testar os processos de que se serve a fraude
para levar até ao fim os seus intentos. De resto, uma corporação de carácter
oficial, a Comissão de Viticultura da Madeira, chegou, nêste ponto, a
conclusões verdadeiramente interessantes, que desassombradamente expôs ao
governo e que o devem ter elucidado inteiramente sobre o modo como ali se está
tratando de operar o descrédito dos afamados vinhos generosos daquela ilha.
Mas, perguntar-me-há a Câmara, perguntar-me-há, sobretudo, o nosso ilustre
colega sr. dr. Brito Camacho que me dá a honra de escutar, e que conhece, como
poucos, a legislação vinícola da Madeira: como se poderá obter o álcool para a
preparação dêsses vinhos, se os vinhos produzidos na Madeira estão sujeitos a
manifestos de produção e de trânsito, e se só a estes póde ser fornecido o
álcool de que carecem para a sua beneficiação? A esta observação eu
responderei: Pois até já se calca aos pés êste preceito legal, importando
fraudulentamente aguardente vínica, em cascos habitualmente usados para o
transporte de vinho, despachados como vinho de pasto! Ainda há três dias se
realizou na Madeira uma importação deste género, que a alfândega apreendeu”
(Continua)
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