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domingo, 19 de junho de 2022

 

Conflitos da Autonomia -Resposta de Salazar ao Presidente da Junta Geral-A

 

Em 23 de maio de 1935, o Dr. Oliveira Salazar, Presidente do Governo, enviou uma carta ao Presidente da Junta Geral, Dr. João Abel de Freitas, respondendo à carta deste, de 28 de março daquele ano. Não podia ser mais clara a visão do Presidente do Governo quanto ao mal-estar vivido na Região e quanto ao conceito de autonomia. Era também corolário de uma exposição da Junta Geral, de 5 de Abril, de um ofício do Governador Civil, da mesma data, e de um memorial, de 21 de Abril, assinado por Pestana Reis, Juvenal Araújo e Favila Vieira.

 

Salazar inicia a carta afirmando: “Esta carta é uma carta particular embora trate de questões da Madeira que a V. Exª. interessam por se encontrar à frente da Junta Geral. Escrevo-a despreocupadamente, sem a menor ideia de que redijo alguma coisa parecida com documentos oficiais, e apenas para corresponder à amabilidade da carta de V. Exª. e às gentilezas de que usou para comigo e para com o Douor Mário de Figueiredo, quando aí passamos duas semanas.

Nestas duas semanas não perdi o meu tempo: não só apreciei as belezas naturais da ilha e a hospitalidade de muitos amigos ou simples contemporâneos de Coimbra, mas pude fazer ideia in loco de certos problemas e da mentalidade madeirense. Isto me tem servido no Governo para estudar as reclamações que me vêm daí e não perder a serenidade ou a paciência adiante de tudo o que, por dever do cargo, sou obrigado a ouvir e a ler – e posso dizer que leio tudo quanto daí vem há bastantes anos a esta parte.

(…) vou tentar dizer-lhe alguma coisa do que penso acerca dos principais pontos tocados na carta de V. Exª.e no resumo dos deputados”.

 

A carta de Salazar aborda  dezanove temas, tais como a) Mal Estar Geral; b) Situação Financeira da Junta; c) Câmaras Municipais; d) Regime Sacarino; e) Bordados; f) Frutas e Géneros Hortícolas; g) Vinhos; h) Lacticinios; i) O Mesmo Quanto à Industria de Vimes; j)Turismo; k) Sanatório para Tuberculosos; l) Liceu; n) Bairro Económico; o) Lotaria; p) Portos; q) Fundo de Desemprego; r) Empréstimo da Junta; s) Juros de mora; t) Imposto de Viação e Turismo; u) Outras Receitas.

 

Quanto ao Mal Estar Geral, destaca: “Antes disso porém farei breve referência ao “mal estar geral” da Madeira traçado com negras cores tanto na carta de V. Exª. como na exposição da Junta. O abandono da Madeira por parte do Poder Central» entrou na formação da consciência madeirense e vejo que os dirigentes da situação política não podem rebater essa falsa ideia. Como disse acima, leio tudo o que vem da Madeira há bastantes anos e já tenho experiência do Governo suficiente para não me irritar ou sequer para me importar além de certa medida com o que se diz aí da acção do Governo.

Apenas porque é preciso rectificar os erros, mesmo comuns e gerais, e fazer sempre a política da verdade, é preciso dizer que há muitas dezenas de anos não tem a Madeira quem tanto a tenha protegido e defendido como eu. São factos históricos que não vale a pena estar a citar, mas com alguma ilustração ou memória (eu os povos não têm mas as pessoas cultas devem possuir) quem quer pode fazer a comparação de antes e depois, os problemas abandonados e os resolvidos e o quanto em dinheiro que isso tem custado. Repito-lhe que não me importa continuar a ler o contrário: desde os meus amigos mais queridos ou inimigos confessos, desde a extrema direita à extrema esquerda, se ainda há disso na política daí, desde os bons conservadores aos revolucionários ou conspiradores de profissão, desde os católicos aos indiferentes e aos ateus – todos em comovedora unanimidade, assentaram ou estão assentando em que a Madeira é uma “filha enjeitada”. E não tenho visto que ninguém, com os factos, só com os factos, tenha contrariado a campanha.

V. Exª. mesmo está convencido de que a Madeira tem sido “completamente abandonada”. Dou graças a Deus por me ter permitido ver o que vi, quando da minha viagem, para compreender este fenómeno que à minha volta pouca gente compreende. E, porque compreendo é que a Madeira continuará sendo tratado como terra privilegiada e com paciência, ao menos enquanto se não desmandarem demais. Porque, se o fizerem, é conveniente não esperar a doçura da repressão usada outra vez. E podem continuar dizendo à vontade que os abandonam”

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