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domingo, 19 de junho de 2022

 

Conflitos da Autonomia -Resposta de Salazar ao Presidente da Junta Geral -B

 

“A AUTONOMIA NÃO É A AUTONOMIA DE GASTAR (…)”

 A carta de Salazar responde à situação financeira da Junta Geral, escrevendo: “Não entro em pormenores acerca da situação financeira da Junta mas ponho apenas o problema central. É curioso que a forma por que a Junta daí vem pondo a questão das suas finanças é rigorosamente igual àquela que vejo nos documentos das Juntas Autónomas de Ponta Delgada e de Angra e até de serviços autónomos do estado. Todos os partidários de autonomia supuseram que esta consistia simplesmente na liberdade de gastar, dando o Poder Central quanto fosse necessário para isso. Admitido este princípio e generalizado com muita razão às Câmaras Municipais, nós tínhamos dentro de muito pouco a maior catástrofe de que há memória. Aí, nos Açores e mesmo aqui puseram-se todos a formular projectos e planos, às vezes interessantes mas ousados, caríssimos e na maior parte adiáveis para outras oportunidades, arbitraram-lhes o custo  e dizem pelos mesmos termos ao Poder Central: Queremos fazer isto ou aquilo e as receitas não chegam. 

Portanto aumente-se as receitas ou tire-se o encargo de algumas despesas. Eu não posso aceitar o problema assim posto.

A autonomia não é a autonomia de gastar mas a de administrar um património ou uma receita, tirando de um ou de outra o maior rendimento. Do facto de a receita não chegar para tudo o que apetece ou há mesmo necessidade de fazer, não se que é ao Governo que incumbe cobrir as diferenças. E este sobre quem as havia de lançar?

Com ou sem autonomia, no fundo o que temos é sempre o problema da distribuição dos rendimentos públicos pelas necessidades gerais. De modo que eu só posso aceitar o princípio da rectificação das receitas e despesas atribuídas à Junta, quando esteja demonstrado que os mesmos serviços estão no continente mais bem dotados do que nas ilhas. Nesta hipótese devo tirar daqui para aí mas não tenho que fazê-lo necessariamente  -  nem mesmo devo visto serem todos iguais – só porque as receitas não bastam para todos os melhoramentos e obras, algumas das quais esperaram já não digo anos mas séculos. Tenho repetido isto mesmo algumas vezes aos açorianos, ainda que com pouco resultado. Vêm uns tantos a Lisboa e não passam de Sintra ou dos Estoris; e é com as ruas asfaltadas ou cimentadas da Baixa e com um ou outro palácio em reconstrução que se fazem as comparações. É conveniente para fazer melhor ideia das coisas visitar as aldeias de Trás-os-Montes ou da Beira. Se em meios de comunicação, em obras de assistência pública, em instrução, instalações de serviços, etc. se estiver melhor aqui, o meu dever é corrigir o que não está bem e atribuir mais receitas ou lançar menores despesas sobre as Juntas ou serviços autónomos. Quero dizer, tem de ser rectificada a distribuição actual. Antes disso não. Em resumo: não é porque lhes falta isto ou aquilo, ou porque desejam isto ou aquilo que há razão para reclamar; mas porque lhes falta o que porventura já temos aqui. Eu creio que apesar de tudo estão melhor na Madeira, mas porque não tenho ideias preconcebidas rendo-me à demonstração dos factos (…).

(…) a minha opinião acerca de administração das Juntas é má: muito pessoal, remunerações por vezes superiores às do Estado, serviços demais com duvidosa eficácia, contratos ruinosos, administração improvisada, falta de planos de conjunto, bastas mudanças de orientação, etc. Isto tenho eu observado e há-de ter algum remédio, se os próprios lho não darem. E não é só nas Juntas: aqui temos o mesmo problema e as mesmas faltas nas Câmaras Municipais. O entusiasmo das grandes realizações desvairou a muitos, e se o Governo não se mete a providenciar e a dirigir superiormente, travando o destemperado espírito de grandezas da nossa gente, a falência seria temerosa. (…)”

 

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