Alberto João escreveu ser ridículo os analfabetos poderem
votar
- “Enuncia o Dr. Mário Soares o princípio da
autodeterminação. Mas não explica como há-de funcionar esse princípio. Será que
se pretende seguir o princípio «um homem, um voto? Creio firmemente nesse
princípio quando aplicado às sociedades evoluídas da Europa, embora não
aplicado indistintamente. E quando digo «não indistintamente», significa que
não concordo com o voto estendido aos analfabetos ou aos menores ou aos
interditos. No entanto, aplicar o princípio a uma zona onde o homem de tanga
vive ao lado, ou quase, do universitário, do alto funcionário, do clérigo, do
industrial, do operário especializado, do operário com instrução, acho pura e
simplesmente ridículo”.
Alberto João - In «Voz da Madeira», 16/09/1970
- “Os homens ao aceitarem a necessidade da exigência da
sociedade politicamente organizada, não lhe cederam toda a sua liberdade, toda
a sua capacidade individual de querer, optar ou recusar”.
– “As eleições são
o grande julgamento a que os administradores da coisa pública têm de
submeter-se”.
– “Porém, certos exageros levaram, nalguns casos, ao
descrédito do significado do voto. Ou
alargou-se demasiado o seu âmbito (sistema «one mon, one vote», atribuindo-se
ao analfabeto, ao menor ou ao tribal, por exemplo, idêntica capacidade de
decisão à que têm direito aqueles que são capazes civicamente”.
Alberto João - In «Voz da Madeira», 05/04/1972
Estavamos em plena vigência do consulado marcelista, altura
em que havia a esperança de mudanças na abertura política do regime do Estado
Novo. Os portugueses queriam que fosse abolido o resquício do salazarismo
caquético que vigorou desde os anos vinte do século passado, na sequência do
«28 de Maio de 1926». Mário Soares defendeu a autodeterminação das Colónias
portuguesas do Ultramar, varridas pela Guerra Colonial desde 4 de Fevereiro de
1961.
Nas eleições para a Assembleia Nacional, realizadas em 1969,
houve uma novidade importante que foi o facto das mulheres, pela primeira vez,
terem o direito de votar. Mas apenas as maiores de idade e que soubessem ler e
escrever. A limitação do voto também atingia os homens analfabetos. Alberto
João não só criticou, acerrimamente, Mário Soares, mas também, em 1970 e 1972,
defendeu que para votar era preciso saber ler, escrever e, talvez, fazer contas
- isto é, não ser analfabeto.
Na Madeira publicava-se o semanário «Voz da Madeira», em que numa
permanente «TRIBUNA LIVRE» Alberto João escrevia o que entendia, mas defendendo
intransigentemente a política do Estado Novo, nomeadamente em relação à
política ultramarina e à proibição dos analfabetos poderem votar. Era corrente
e normal que, por ideologia arreigada, o articulista defendesse as políticas
totalitárias e de partido único do regime de então – a União Nacional - onde
cabia o princípio de que os analfabetos não deveriam ter o direito de voto!
Com o «25 de Abril de 1974», deu-se uma reviravolta no princípio da
igualdade dos cidadãos quanto ao direito de votar: analfabetos e letrados. Com
a consolidação da democracia, rapidamente Alberto João esqueceu-se do voto dos
analfabetos, ao longo da meia centena de eleições realizadas até agora,
mantendo, no ideário e nos métodos, os princípios de partido único.
Quando, no dia 10 de Fevereiro de 1990, o Conselho Regional
do PSD-M reuniu em Câmara de Lobos para apreciar os resultados das eleições
autárquicas, foi óbvia a grande decisão: “O Partido Social Democrata da Madeira
recusa qualquer consensualismo com a oposição, seja a que nível ou escalão
for”. O delírio destas afirmações fazia crer que o PSD-M era um partido de
consensos, o que nunca o foi nem é. Pelo contrário, é um partido que tem
vocação de um sistema de partido único,
fazendo valer em todas as circunstâncias a sua maioria absoluta, esbarrando a
fronteira do totalitarismo despótico ao bom estilo do Séc. XVIII.
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